Desvalor na natureza e intervenção

Desvalor na natureza e intervenção

A RAPOSA, O COELHO, E AS RAÇÕES DE COMIDA VEGANA

Considere o seguinte experimento de pensamento. Suponha que haja um coelho e uma raposa que está prestes a capturá-lo e comê-lo. Somos testemunhas disso, e temos duas rações de comida vegana. Estamos a considerar o que fazer. Dentre as diferentes maneiras nas quais poderíamos agir, existem as três seguintes:

  1. Comemos uma das rações de comida vegana e assistimos a raposa pegar  e comer o coelho.
  2. Damos à raposa uma ração de nossa comida vegana e nós mesmos matamos e comemos o coelho.
  3. Damos à raposa uma ração de nossa comida vegana, comemos a outra ração e o coelho corre livre para viver sua vida.

Tudo o mais sendo igual, (3) é o curso de ação que traria à tona o menor dano para aqueles envolvidos. Contudo, muitas pessoas, mesmo entre aqueles que estão preocupados com o sofrimento dos animais não humanos, acreditam que deveríamos fazer (1). Interessantemente, muitos deles não considerariam aceitável fazermos (2). Contudo, (1) e (2) são equivalentes com relação aos seus resultados. O coelho não se importa se é a raposa ou o humano que irá comê-lo. Além disso, como questão de fato, (1) e (2) são equivalentes se e apenas se em (2) caçarmos e matarmos o coelho de maneira dolorosa, que é o que a raposa faria (na verdade, se fizermos o coelho experimentar não apenas dor, mas também medo e desespero). Assumamos então que em (2) nós matamos o coelho sem dor. Se for assim, fazendo (1) estaríamos deixando o coelho sentir um dano ainda mais significante do que aquele que ele sofreria se nós fizéssemos (2).

Poderia ser alegado que em (3) há uma consequência ruim que não tem lugar nem em (1) nem em (2), isto é, que gastamos uma ração de comida extra. Poderia ser respondido a isso que seria contudo muito mais preferível utilizar essa comida do que deixar o coelho morrer. Em qualquer caso, se isso fosse considerado um problema importante, há um quarto curso de ação alternativo que poderíamos seguir:

(4) Nós matamos a raposa e a comemos.

Se ter uma ração de comida vegana extra sendo comida é algo que torna um resultado pior do que outro, então (4) é menos pior do que (1) ou (2). Eu penso, contudo, que (4) é certamente pior do que (3), porque em (3) nenhuma matança tem lugar.

Além disso, podemos assumir que em (4), nós matamos a raposa sem lhe causar dor. Mas, nós também poderíamos considerar outro possível resultado no qual isso não acontece:

(5) Nós caçamos a raposa fazendo-a sofrer da mesma maneira que o coelho sofreria se fosse caçado pela raposa.

Esse resultado seria obviamente pior do que (4). Mas, se nós levamos em conta a alegação de que salvar uma ração de comida extra torna um resultado melhor, este poderia ser ainda melhor do que (1). Assim, os resultados que se seguiriam dos diferentes cursos de ação que eu mencionei poderiam ser hierarquizados, do menos danoso para o mais danoso, como se segue:

(3), (4), (5), (2), (1).

Isso significa que de todos os diferentes cursos de ação que eu apresentei, aquele que seria o pior de todos seria deixar o coelho ser comido pela raposa.

Eu defendo isso, é claro, porque assumo que a pior ação é aquela que traz à tona o cenário no qual há o maior dano. Essa idéia é extremamente intuitiva. Contudo, a conclusão que segue dela nesse caso é, prima facie, muito contra-intuitiva. É claro, é possível que seja assim porque, afinal das contas, poderíamos pensar que tentar colocar em prática o curso de ação (3) como uma política geral poderia ter consequências indiretas inesperadas que seriam indesejáveis. Essa é uma suposição justa, a qual eu voltarei a ela mais tarde. Mas, por enquanto eu não quero avaliar se uma política poderia ser colocada em prática com sucesso agora mesmo ou não; ao invés, eu apenas quero acessar se nós temos quaisquer razões morais para não ajudar os animais não humanos vivendo no mundo selvagem. Essa idéia sozinha já é contra-intuitiva para muitos, mesmo apesar de que, como eu disse, ela segue de suposições extremamente intuitivas. Então, independentemente da questão prática, há uma questão moral aqui, e é esta última que eu quero examinar.

Então, como vamos lidar com esse problema? Toda vez que encontramos uma ideia que é contra-intuitiva, lutamos ardentemente para encontrar uma razão para desacreditá-la. Eu tentei fazer isso com essa conclusão, e procurei por uma resposta que poderia autorizar-nos a rejeitá-la. Vou apresentar agora o que acredito que sejam as principais maneiras nas quais é possível tentarmos nos opor a essa conclusão. Contudo, defenderei que nenhuma delas é plausível.

O APELO À AGÊNCIA MORAL

Muitas vezes é alegado que nós somos agentes morais que podemos refletir sobre os resultados de nossas ações enquanto a raposa não é (por “nós” eu quero dizer aqui aqueles que podem refletir sobre essas questões, não “humanos”, como é muitas vezes assumido, dado que existem muitos humanos que não são agentes morais). De acordo com isso, a raposa não pode ser culpada por aquilo que faz. Isso está completamente correto. Contudo, isso não nos diz nada sobre o que nós, ao invés da raposa, deveríamos fazer. Esse argumento apenas mostra que nós não podemos alegar que a raposa possui um dever de não comer o coelho. Mas, o problema tem a ver, ao invés, com se nós deveríamos fazer algo para evitar o dano que a raposa não pode ela mesma evitar.

OS DIREITOS DOS ANIMAIS NÃO HUMANOS

Poderíamos também alegar que interferindo na predação estaríamos violando os direitos desses animais de serem deixados com seus próprios negócios. Dado que a raposa não é responsável pelos seus atos, como vimos, seria uma violação de seus direitos interferir na sua caçada. Essa linha de raciocínio, contudo, é também falha. Existem várias coisas a serem ditas aqui. É claro, podemos rejeitar o argumento completamente se não acreditamos na existência de direitos morais. Mas, vamos deixar de lado essa resposta. Suponha que existam direitos morais. O que se segue disso? Seguiria a conclusão mencionada?

Bem, primeiramente, há que se apontar que há algo bastante preocupante com esse argumento: o fato de que ele foca nos interesses da raposa enquanto se esquece completamente do coelho. Se a raposa tem direitos, então parece que também tem o coelho. E, se direitos têm algum sentido, é para proteger os interesses daqueles que os possuem. Assim, se o coelho tem direitos, então parece dificilmente credível que a melhor maneira de defendê-los seria fazer o que lhe causa o maior dano. A ideia de que nós estamos violando os direitos do coelho por salvá-lo de uma morte terrível é implausível. Se estamos fazendo alguma coisa, estaríamos é a violar os direitos dele por não socorrê-lo, como veremos abaixo.

Passemos agora aos direitos da raposa. O argumento que estou considerando parece implicar a suposição de que interferimos nos direitos daqueles que não são agentes morais se não os deixamos agir como eles querem. Mas, essa é certamente uma alegação implausível. Existem muitos exemplos possíveis para iluminar isso. Deixe-me colocar um autobiográfico. Meus pais me disseram que quando eu era um bebê eu gostava de atirar objetos de diferentes tamanhos pela janela (eu estou a falar de um caso real). Minha família vivia em um apartamento do quinto andar, e ao fazer isso eu poderia seriamente danar algum pedestre. Então eles, corretamente em minha visão, interferiram no meu atirar de coisas pela janela, e as fechavam completamente quando eu estava sozinho. Eu penso que está claro que ao fazer isso eles não estavam violando nenhum direito que eu poderia ter. Poderia ser alegado que eu não tinha realmente necessidade de atirar esses objetos pela janela, enquanto que a raposa precisa caçar. Mas, note que no experimento de pensamento que eu apresentei aqui isso não é necessário, porque podemos dar à raposa um pouco da comida que temos. (Poderíamos pensar que isso torna o experimento de pensamento inútil, mas veremos adiante que definitivamente esse não é o caso).

Somando-se a isso, mesmo que se violasse os direitos de alguém ao interferir em sua ação, isso pode ser considerado perfeitamente justificável, dado que os direitos da potencial vítima também estariam envolvidos. Considere novamente o exemplo que eu me referi. O fato é que mesmo se os meus pais estivessem realmente violando algum direito meu quando eles não permitiram que eu atirasse coisas através da janela, parece óbvio que eles estivessem justificados a fazer assim, devido aos riscos envolvidos para os pedestres. Se esse fosse o caso, haveria um conflito entre o meu alegado direito de atirar coisas pela janela e o direito dos pedestres de não serem danados por objetos voadores. Não há nenhuma razão relevante aqui para julgar de maneira diferente o experimento de pensamento que estamos a considerar com relação à raposa e ao coelho. Note também que no caso particular que eu apresentei não estamos a danar a raposa. A raposa vai comer de qualquer maneira. Contudo, existem algumas pessoas que em tal caso ainda assim rejeitariam que deveríamos fazer (3). Isso significa que estão a aceitar razões de um tipo diferente para se opor a intervir na predação.

De fato, uma vez que aceitamos que todos os seres sencientes têm direitos, não está claro como é que podemos evitar a conclusão de que as vidas deles deveriam ser defendidas, mesmo se eles estão a ser ameaçados por seres que não são agentes morais. De fato, comumente acredita-se que se um bebê está prestes a ser comido por algum predador – digamos, um lobo – ele deveria ser salvo. Por que deveríamos agir de maneira diferente se a vítima não é humana? Parece que esse tratamento diferencial só pode estar baseado em uma posição especista [1].

TER A CAPACIDADE DE EVITAR UMA AMEAÇA

No prefácio da segunda edição do seu The Case for Animal Rights, [2] Regan alegou que em um exemplo tal como aquele que eu apresentei haveria uma diferença relevante entre o bebê e a raposa. Ele alegou que o primeiro estaria ainda inapto a lidar com as dificuldades da vida, e então de evitar a ameaça colocada pelo predador, enquanto que o coelho estaria completamente preparado para sua vida no mundo selvagem. Mas, não está claro como esse argumento poderia ter sucesso. Afinal de contas, a maioria dos humanos também defenderia salvar um humano adulto que poderia se proteger de ser morto por um lobo. Considere também uma situação na qual um agente moral, David, estava a ameaçar seriamente outra agente moral, Maria. Suponha que David ameace matar Maria porque ele precisa de um doador de coração para sua mãe, e Maria é a única doadora potencial disponível. Suponha, também, que Maria, por sua vez, não coloca nenhuma ameaça a ele ou a alguém mais, e não está a violar os direitos de ninguém de maneira alguma. Suponha também que Maria possui a capacidade de escapar. Bem, ela poderia eventualmente escapar, mas, ela ter a capacidade de escapar não significa que ela irá realmente fugir. Ela poderia não estar apta a fazê-lo por qualquer razão que fosse, mesmo se em princípio ela tivesse a habilidade de fazê-lo. Então, se Maria tem um direito e é possível para nós salvá-la da ameaça que David está a colocar sobre ela, parece que Maria tem um direito de ser salva.

O APELO AO VALOR NATURAL

À luz disso, parece que a única maneira na qual podemos nos opor à visão que eu conclui no experimento de pensamento do coelho e da raposa é por alegar que deveríamos simplesmente não interferir na natureza. Isto é, basicamente, assumir um tipo de posição ambientalista de acordo com a qual há algum valor nos processos naturais que trunfa o desvalor causado aos animais que vivem no mundo selvagem quando eles sofrem e morrem em uma terrível desgraça. De fato, acho que essa visão é muito amplamente compartilhada. Mas, acredito que precisamos rejeitá-la. Na verdade, minha visão é a de que aqueles que a assumem o fazem porque possuem atitudes especistas. A razão para isso é que eles não estariam preparados para aceitá-la de maneira alguma se humanos estivessem envolvidos. Como eu disse antes, eles não aplaudiriam a matança de humanos por outros animais, ou o seu sacrifício em prol do equilíbrio ambiental. Se eles realmente mantivessem essa visão, favoreceriam a chacina em massa de seres humanos, dado o impacto ambiental significante que os humanos possuem. Contudo, eles não defendem medidas desse tipo. E, corretamente, em minha visão. Mas então, eles podem aceitar matar animais não humanos em prol do meio ambiente ou dos processos naturais apenas se assumirem uma posição especista. Não deveria ser surpresa, então, que a visão de que há algum tipo de valor na natureza que trunfa os interesses dos seres sencientes individualmente só tem sido defendida a partir de posições especistas. Como uma questão de fato, aqueles e aquelas que alegam assumir uma visão ecocêntrica na verdade defendem uma combinação de ecocentrismo com uma postura especista antropocêntrica (veja, por exemplo, a posição de Callicott)[3]. Eles rejeitam a ideia de que humanos podem ser massivamente mortos em prol do equilíbrio dos ecossistemas. De qualquer maneira, a visão (mais consistente) de que nós poderíamos ser chacinados por essa razão parece difícil de aceitar.

Concluo, então, que essa linha de raciocínio não pode ser convincente.

DESVALOR NA NATUREZA

Todas as razões apresentadas acima falham em estabelecer que nós deveríamos não tentar ativamente melhorar a situação na qual os animais selvagens se encontram. Humanos muitas vezes intervém na natureza quando isso favorece o seu próprio interesse. Na verdade, eles muitas vezes fazem isso em prol do manejo ambiental (devido ao interesse humano nele). Mas, não há razões para assumir que a intervenção na natureza pode estar correta se é conduzida por aquelas razões mas não se fosse feita para reduzir os danos que os animais não humanos sofrem na natureza. Como já vimos, se a última não é aceitável, então a primeira também deveria ser rejeitada, a menos que assumamos uma posição especista.

Existem muitas maneiras nas quais os animais não humanos são danados no mundo selvagem. A predação é apenas uma delas. Eles morrem de inanição, são atacados por parasitas, sofrem de doenças, etc. De fato, muitos deles vivem vidas que contém apenas, ou em sua maior parte, sofrimento. Isso acontece no caso de todos aqueles animais que morrem quando são muito jovens – comidos por outros ou morrendo de inanição devido à falta de comida. Na verdade, como Yew-Kwang Ng [4] tem apontado, essa pode ser a norma entre a esmagadora maioria dos animais, cuja estratégia reprodutiva é a seleção-r. [5] A seleção-r consiste em ter um número massivo de crias, das quais apenas uma minoria ínfima sobrevive. Se não somos especistas e acreditamos que todos os animais sencientes devem ser moralmente considerados, não há maneira de considerar esse fato como algo neutro. Precisa ser visto como algo negativo. De fato, é interessante notar um ponto aqui. Dentre todas as maneiras nas quais os humanos usam os animais não humanos como recursos há uma que significativamente se sobrepõe às restantes em termos de números: o uso com propósitos culinários. Isto é, comer produtos de origem animal. Todos os outros usos de animais não humanos afetam um número muito reduzido de animais em comparação aos números gigantescos de animais criados ou capturados para serem comidos. Contudo, o fato é que, por sua vez, o número de animais mortos para serem comidos por humanos também é mínimo em comparação aos números de animais que vivem vidas cheias de sofrimento no mundo selvagem. Isso acontece em particular, como Alan Dawrst perspicazmente apontou, devido ao gigantesco número de invertebrados que existem na Terra, que contam como a esmagadora maioria dos animais no nosso planeta. [6]. Como Dawrst alega, esse número é tão alto que trunfa dúvidas com relação à senciência dos invertebrados, em particular, os insetos.

Suponha que a probabilidade de insetos serem sencientes fosse de 0.01 medida em uma escala entre 0 e 1 (isso, em minha visão, é uma estimativa extremamente conservadora, eu alegaria que a probabilidade estaria muito mais perto do 1, mas vamos apenas assumir isso para efeito de argumentação). Agora, estimadamente existem de 10^18 a 10^19 insetos. Isso significa que a preocupação pelos insetos no mundo deveria contar tanto quanto a preocupação por pelo menos 10^16 animais que nós sabemos que podem sofrer. Poderia ser alegado que mesmo que os insetos sejam sencientes, os seus interesses não deveriam contar tanto quanto os daqueles de, por exemplo, mamíferos. Isso poderia ser alegado ao se assumir que a capacidade dos mamíferos para o bem-estar e sofrimento seria mais alta do que a dos insetos. Contudo, isso não mudaria a questão significativamente. Suponha que o bem-estar dos mamíferos contasse 10.000 vezes mais do que o daquele de animais pequenos tais como insetos. Isso significaria que a preocupação pelos últimos deveria contar como a preocupação por 10^12 mamíferos, o que é ainda uma número muito significativo.

Dado isso, o bem-estar dos animais não humanos que vivem no mundo selvagem emerge como uma causa principal de desvalor e, então, como um problema que é um quebra-cabeças para a ética que não irá desaparecer apenas porque nós não queremos nos incomodar a considerá-lo. A tarefa para aqueles que se engajam na reflexão sobre problemas morais é não descartar aqueles dilemas que são difíceis ou paradoxais, mas se engajar no trabalho de entendê-los deixando de lado quaisquer preconceitos que se poderia ter previamente.

O QUE FAZER?

Para muitas pessoas, a alegação de que o sofrimento dos animais na natureza se sobrepõe ao seu bem-estar, e de que isso não é algo bom ou neutro, mas ao invés negativo é, à primeira vista, muito contra-intuitivo. Eu esperava profundamente que tivéssemos razões para rejeitá-la. Infelizmente, tais razões não parecem existir.

Como eu sugeri acima, uma solução fácil seria desacreditar a questão, talvez propondo algum argumento ad hoc ou assumindo, talvez, que tem de haver algum argumento misterioso ainda a ser descoberto que poderia resolver esse problema. Mas certamente essa não pode ser a solução que vamos abarcar se somos agentes morais responsáveis que não querem ser incoerentes.

Então, o que fazer com relação a isso? O fato é que nós já estamos intervindo de muitas maneiras diferentes na natureza. Então, faz sentido calcular maneiras de fazê-lo nas quais seja possível diminuir, ao invés de aumentar, o sofrimento animal. De qualquer maneira, parece que não é possível ter sucesso no presente na tarefa de realmente alcançar uma redução radical dos danos que os animais selvagens sofrem. De fato, como eu já mencionei acima, sem o conhecimento apropriado nossas ações poderiam ter consequências infelizes não previstas. Essa é a principal razão técnica para pensar duas vezes antes de intervir de qualquer maneira, apesar de que essa não é uma razão moral para não intervir para beneficiar os animais não humanos se nós tivéssemos tal conhecimento. Note, como eu mencionei acima, que os humanos continuamente intervém na natureza – a única diferença é que eles o fazem em prol do bem-estar humano ou por razões ambientalistas, não em prol dos animais não humanos. Essa é a razão pela qual o experimento de pensamento apresentado acima não é inútil. Além disso, os empecilhos técnicos de maneira alguma implicam que não podemos fazer nada para ajudar os animais selvagens. Existem dois projetos pragmáticos dos quais os animais precisam que embarquemos hoje com relação a isso. Primeiro, deveríamos tentar encorajar a comunidade científica a estudar essas questões. Segundo, deveríamos nos engajar em promover a consciência, particularmente entre aqueles que já estão preocupados com o problema do especismo, sobre a significância moral dos danos que incontáveis animais não humanos sofrem no mundo selvagem. Essa segunda tarefa é na verdade muito mais necessária do que a primeira.

Fazendo isso agora, tornaremos possível para aqueles que virão no futuro fazerem algo sobre essa questão. Nosso trabalho agora é preparar as bases para as gerações futuras tomarem ação aonde podemos estar atualmente inaptos a agir.[7]

NOTAS

[1] Especismo é a discriminação, isto é, a consideração ou tratamento desvantajoso injustificado daqueles ou daquelas que não pertencem a uma certa espécie. Ver Horta, Oscar, “What Is Speciesism?”, Journal of Agricultural and Environmental Ethics, 23, 2010, 243–66.

[2] Regan, Tom, The Case for Animal Rights, 2nd ed., University of California Press, Berkeley, 2004.

[3] Callicott, John Baird, In Defense of the Land Ethic: Essays in Environmental Philosophy, State University of New York, Albany, 1989.

 [4] Ng, Yew-Kwang, “Towards Welfare Biology: Evolutionary Economics of Animal

Consciousness and Suffering”, Biology and Philosophy, 10, 1995, 255−85.

[5] Pianka, Eric R., “On r– and K– Selection”, American Naturalist, 104, 1970, 592–97.

[6] Dawrst, Alan, “The Importance of Wild-Animal Suffering”, Essays on Reducing Suffering, 2007 (http://www.utilitarian-essays.com/suffering-nature.html).

[7] Por comentários úteis sobre esboços anteriores desse artigo, eu gostaria de agradecer a Alan Dawrst, Daniel Dorado, Kate Marples e Mark Lee. Também agradeço a sua tradução a Luciano Carlos Cunha

* Publicado originalmente em inglês em Pensata Animal, 34, 2010. Tradução de Luciano Carlos Cunha (UFSC) [email protected]

Por Oscar Horta / Tradução de Luciano Carlos Cunha

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