Especialistas traduzem capítulo de livro sobre Captura, Esterilização e Devolução de gatos

Especialistas traduzem capítulo de livro sobre Captura, Esterilização e Devolução de gatos

A médica veterinária Jéssica Torquato e o gestor ambiental Eduardo Pedroso despenderam tempo e esforços para traduzir e adaptar o Manual de CED da Neighborhood Cats. O trabalho até agora resultou na tradução do segundo capítulo do livro, que na avaliação do gestor e agente de CED Eduardo Pedroso, é o mais importante.

“Claro que o manual inteiro é interessante e pode ser aproveitado, mas o capítulo O que é CED? tem a virtude de demonstrar com muita clareza e objetividade os benefícios do emprego do método no controle ético de gatos de vida livre. Quem ler esse capítulo vai adquirir argumentações poderosas para cuidar das colônias “in loco”, quer dizer, aplicar CED e não remover os gatos para abrigos de ONGs ou prefeituras.”

A Neighborhood Cats é uma ONG de Nova York (EUA) dedicada a pratica de CED.

A dupla de especialistas propôs ao Olhar Animal publicar com exclusividade o trabalho que pretende disseminar informações para fortalecer a cultura de CED no Brasil.

Manual de CED da Neighborhood Cats

2 – O que é CED?

Captura, Esterilização e Devolução (CED) é um método eficaz e humanitário de controle da população de gatos de vida livre. O método CED permite manejar colônias[1] e reduzir de maneira substancial a quantidade de gatos de rua de uma localidade. O processo envolve a captura, castração[2], marcação de orelha para identificação[3], vacinação contra a raiva e devolução dos mesmos aos seus territórios. Quando for possível e viável, os adultos vulneráveis e filhotes bem novos devem ser abrigados para domesticação e destinados a adoção.

O ponto de apoio[4] fica responsável por fornecer alimento regularmente para os gatos devolvidos, além de monitorar possíveis novos gatos que possam se aproximar ou sejam abandonados no local, além de contornar conflitos que possam ocorrer na comunidade humana e que sejam motivados pela colônia.

O método CED oferece uma série de benefícios para as comunidades humanas e para as colônias de gatos. Para praticar CED é aconselhável ter conhecimento desses benefícios para poder argumentar sempre que necessário. CED ainda é um conceito relativamente novo e muitas pessoas não entendem o porquê é uma boa ideia devolver os gatos para seus locais de origem. Então vamos explicar:

  • Benefícios do método CED para a colônia de gatos
  1. Fim das ninhadas e redução gradual da população. Se todos os gatos forem castrados, ou pelo menos todas as fêmeas, não nascerão mais filhotes na colônia. Se novos gatos aparecerem na colônia e forem rapidamente capturados e castrados, ou adotados (animais dóceis abandonados), o tamanho da colônia vai diminuir ao longo do tempo.
  2. O barulho será reduzido drasticamente. A maior parte dos barulhos de uma colônia sem controle está relacionada aos acasalamentos, aos miados e às brigas – comportamentos que são severamente reduzidos em função da castração.
  3. Cheiros ruins diminuem. Machos não castrados costumam marcar território esguichando urina com felinina, uma substância que potencializa o odor da urina. A castração elimina a produção de testosterona, que altera o comportamento do macho e torna menos frequente ou nula a marcação, reduzindo o mau cheiro.
  4. O controle biológico de roedores é mantido. Gatos proporcionam uma forma natural de controle de ratos. O cheiro do gato afugenta sua presa. Devolver os gatos para a colônia após a castração permite a continuação do controle.
  5. Uma colônia saudável e menos visível. Castração, rotina de alimentação e abrigo[5] melhoram muito a saúde dos gatos. Como consequência, eles estarão muito menos propensos a infestação por parasitas como pulgas, uma vantagem para os seus vizinhos humanos também. Além disso, gatos castrados tendem a vagar muito menos e assim se tornam menos visíveis e vulneráveis[6].
  6. Fim da pena e da tristeza. A vizinhança não observará mais gatos com fome ou filhotes morrendo. Situação recorrente em colônias não controladas.
  7. Ponto de apoio. Uma pessoa passará a ser responsável pela colônia e para resolver problemas com os vizinhos[7].
  8. Impede a formação de uma nova colônia. A remoção de uma colônia deixa o território livre para a chegada de uma nova colônia. Os problemas retornam. Isto é conhecido como efeito vácuo, um fenômeno que será discutido neste capítulo. Esterilizar a colônia e deixá-la no local quebra o ciclo de repovoamento. A colônia normalmente protege seu território de novos gatos se durante a manutenção da rotina de alimentação o ponto de apoio oferecer ração apenas o suficiente para o número de animais que compõem a colônia[8].
  • Benefícios do método CED para a comunidade
  1. a) Redução da população de gatos de vida livre. Se o trabalho de CED é feito corretamente, o número de gatos ferais e de rua diminuirá ao longo do tempo. A população será controlada a medida que as colônias forem beneficiadas pelo método.[9]
  2. Diminuição de abrigos e eutanásias. Gatos ferais e suas ninhadas estão tomando os abrigos nos EUA, aumentando a superlotação e drenando os recursos das entidades que mantém esses abrigos. Gatos ferais não são adotáveis e para que não concorram dentro do abrigo com gatos mansos e disponíveis para adoção, são eutanasiados. Quando não adotáveis são eutanasiados.[10] A redução do número de gatos de vida livre através do método CED faz diminuir a superlotação e a necessidade de eutanásia, recursos são economizados e podem ser utilizados para promover ações de CED.
  3. Menos reclamações. A esterilização silencia a colônia. Ruídos e barulhos associados ao comportamento de gatos não castrados desaparecem, e os odores diminuem muito. Com a colônia controlada a vizinhança não aciona o serviço público para investigarem ocorrências envolvendo animais, aliviando a sobrecarga de trabalho das autoridades sanitárias.
  4. Controle da raiva. Em regiões onde há ocorrência da raiva a vacinação faz parte do protocolo de CED. (No Brasil temos casos recentes de mortes humanas causadas pelo vírus da raiva. Portanto os agentes de CED precisam incluir em sua rotina de trabalho a cobertura vacinal da população de gatos de vida livre).
  5. Capacidade de mobilizar voluntários. Ações de CED são proativas e um grande número de pessoas se preocupa com o bem-estar dos gatos de rua. Voluntários podem contribuir com seu tempo, trabalho e recursos para auxiliar nas ações. Nos EUA há milhões de gatos de vida livres, um exército de voluntários com o objetivo único de pôr fim à superpopulação de forma digna e humanitária poderia ser mobilizado.[11]
  6. A redução de custos dos abrigos. Sempre que um gato é capturado, levado para um abrigo e eutanasiado há custos. Despesas com o laçador/capturador e toda a estrutura do abrigo, comida, pessoas etc demandam recursos. O próprio procedimento de eutanásia é um custo, assim como o descarte do corpo.
    Abrigos deixam de ser onerados quando grupos fazem o controle com o método CED.[12]
  7. Ponto de apoio. O “Cuidador da colônia” normalmente conhece bem a mesma, o número de gatos e seus hábitos, se há algum castrado, se há ninhadas e outras informações relevantes. Ele pode ajudar nas capturas e na preparação da intervenção de CED, é ele que retira a comida dos animais dias antes da chegada do agente de CED para que sintam fome e sejam passíveis e captura. A cooperação do ponto de apoio é essencial e crucial para qualquer tentativa bem-sucedida no processo de controle e para que os gatos não sejam prejudicados.
  8. Melhoria da imagem de órgãos públicos. A medida que órgãos públicos adotam o método CED no lugar de capturar e remover os gatos, a imagem pública desses entes governamentais se torna positiva. Isso aumenta o número de voluntários que servem os abrigos municipais, aumenta o número de adoções de gatos mansos nesses locais e ajuda nas doações de recursos.
  • Outras alternativas falharam

Uma das razões mais convincentes para se aplicar o método CED é que nada mais funciona! Para atingir as metas de redução populacional e comportamento incomodo, nenhuma outra técnica tem uma chance real de sucesso a longo prazo. Um exame das alternativas disponíveis para o método CED deixa isso claro.

1. Captura e remoção

“Captura e remoção” é muitas vezes referido como “captura e eutanásia” porque a eutanásia é a saída comum para os gatos. Nós preferimos utilizar o termo “captura e remoção” porque o objetivo dessa técnica é eliminar os gatos do ambiente. Essa tem sido a abordagem para os gatos ferais predominante nas agências de controle de animais dos EUA durante décadas. A atual proliferação de gatos em cada canto desse país demonstra a ineficácia da eutanásia na redução das populações a longo prazo. Há várias razões que demonstram que a eutanásia não funciona.

    • O efeito vácuo
      As colônias de gatos surgem e subsistem em determinados locais porque o habitat fornece comida e espaço adequados. Quando uma colônia é removida e o habitat permanece inalterado, os gatos recentemente abandonados na região ou que pertencem a colônias vizinhas, deslocam-se para o território vago para aproveitar as condições existentes. O ciclo de reprodução recomeça e uma nova colônia surge rapidamente, ganhando o tamanho que as condições permitirem. Esse fenômeno é conhecido como “Efeito Vácuo”, documentado pela primeira vez pelo biólogo Roger Tabor em seus estudos sobre gatos de rua de Londres (Tabor, R., A vida selvagem do gato doméstico, 1983). Alterar o habitat para desencorajar a imigração de novos gatos é muito difícil. Muitos fatores colaboram para a existência de uma fonte de alimentação, sacos de lixo mal-acondicionados, latas de lixo abertas ou uma pessoa que se compadece dos gatos e passa a alimentá-los. Um estudo demonstrou que um quarto dos entrevistados em uma pesquisa em Ohio tinha alimentado recentemente um gato feral ou de vida livre. Lord, L., Attitudes toward and perceptions of free-roaming cats among individuals living in Ohio,1983. Journal of the American Veterinary Medical Association Vol. 232: 1159-1167.
    • Elevação da taxa de reposição
      A captura de todos os membros de uma colônia pode ser feita, e um dos objetivos desse manual é o de explicar como isso se faz. Isso requer conhecimento profundo da colônia, treino, paciência e dedicação. Quando autoridades sanitárias capturam e removem gatos ferais, raramente têm informações ou tempo necessários para fazer o trabalho completo e, inevitavelmente, alguns gatos são deixados para trás. Estes gatos têm menor competição por alimento e abrigo, o que resulta no imediato aparecimento de ninhadas elevando a taxa de reposição da colônia até seu limite de espaço e comida.
    • Falta de recursos para controle de animais
      Nesse momento há tantos gatos ferais no meio ambiente que são raras as agências de controle que têm mão de obra suficiente para capturar e remover um número significativo de animais das colônias. Assuntos mais urgentes, como cães perigosos, têm prioridade. A captura de gatos geralmente ocorre em resposta a reclamações. Um funcionário estatal se dirige ao local, instala armadilhas para um número desconhecido de animais (para ele), volta em algumas horas para remover os que caíram nas armadilhas, e logo em seguida parte para outra colônia. Muitas cidades, como Nova York, reconhecem a futilidade desta abordagem e o desperdício de enviar um funcionário sem planejamento para promover controle, a menos que haja no local um problema grave de saúde pública[13].
    • Sem colaboração do ponto de apoio
      Como mencionado anteriormente, uma das vantagens do método CED é que os pontos de apoio das colônias cooperam com o trabalho de controle. Por outro lado, se a abordagem for para capturar e eutanasiar os gatos, haverá resistência ativa e passiva. Resistência passiva significa ocultar informações, como o número de gatos e onde ficam os pontos de alimentação dos mesmos. A resistência ativa pode levar o ponto de apoio a alimentar os gatos antes do trabalho de captura para que eles não entrem nas armadilhas e mesmo fechar ou danificar os equipamentos de captura.
    • Sinergia
      Na maioria das situações que envolve captura e remoção há mais de um fator relevante presente ao mesmo tempo, o efeito vácuo, taxa de reposição, falta de recurso, resistência do ponto de apoio, etc. Esses fatores combinado tornam a técnica captura e remoção totalmente ineficaz para o controle populacional. Municípios que continuam a utilizar este método observam ano após ano o aumento da população de gatos de vida livre e das taxas de eutanásia, assim como o aumento das reclamações dos munícipes. Estes números indicam que o que ocorre na verdade é apenas a rotatividade da população e não a redução, novos gatos e não menos gatos. Logo, a captura para remoção e eutanásia não é efetiva.
    • Proibindo a alimentação
      Proibir que alimentem os gatos é o apelo das autoridades que tentam reduzir a população de gatos de vida livre – “parem de alimentar os gatos e eles vão embora”, é a orientação mais comum e simplista. Esta abordagem é, no entanto, cruel e irresponsável. Se a proibição eventualmente funciona, isso se dá porque os gatos morrem de fome ou vão formar colônias em outros lugares, levando problemas para esses lugares.
      Uma vez que a proibição seja inevitável, nem todos os gatos vão morrer ou pegar um ônibus para a próxima cidade. Gatos ferais são extremamente territorialistas e não vão vagar longe em busca de comida. São bastante engenhosos e a medida que a fome cresce, vão invadindo espaços habitados, como lares e locais de trabalho ou qualquer outra fonte de alimentação que não havia sido explorada anteriormente, além disso seu extinto de caça fica aguçado elevando o nível de predação. Gatos podem sobreviver por semanas sem comida e mesmo assim continuam a se reproduzir. Entretanto desnutridos ficam vulneráveis a parasitas, como pulgas. Uma história comum é a da empresa em que alguém com poder proibiu a alimentação dos gatos. Os gatos, antes alimentados e saudáveis, passam a invadir os escritórios e as fábricas em busca de comida. Como estão debilitados e cheios de pulgas, infestam os locais.
      Uma das razões pelas quais a proibição de alimentação é falham é porque essas ordens são quase impossíveis de se fazer cumprir. Pontos de apoio sentem-se mais ligados aos gatos da colônia do que muitos donos em relação a seus animais de estimação, e não os abandonam nunca pois sabem que os gatos dependem deles. Pontos de apoio repetidamente arriscam seus empregos, suas casas, arriscam ir para a cadeia, levam multas e sofrem danos corporais para evitar que os animais morram de fome. Dado o nível e a intensidade da resistência que tipicamente surge quando uma proibição alimentar é imposta, a imposição torna-se impraticável em áreas de tamanho significativo. Pontos de apoio simplesmente vão alimentar quando ninguém estiver por perto. As tentativas de banir a alimentação geralmente resultam em sofrimento para os animais e conflitos entre os moradores próximos da colônia, colocando aqueles que cuidam dos gatos contra aqueles que são intolerantes com animais.
    • Resgate ou alocação
      A Neighborhood Cats incentiva a colocação dos gatos adotáveis e filhotes em casas que sejam bastante responsáveis[14]. Isso é o que de mais humano os agentes de CED podem fazer para reduzir a população de gatos de rua. Entretanto a ideia de que os gatos ferais devem ser capturados e confinados é fantasiosa. Há muitos mais gatos ferais do que pessoas e lugares com disposição e paciência para socializá-los. Talvez isso mude um dia, mas há um longo caminho a percorrer[15]. Os recursos presentes são melhores empregados na esterilização da população de gatos ferais do que gastá-lo em um processo longo e incerto de domesticação, especialmente quando há uma enorme quantidade de gatos mansos morrendo em nossos abrigos por falta de adoção. Por amor ao gato de rua, permitir que ele viva na colônia é uma escolha mais compassiva do que mantê-lo apavorado em uma caixa de transporte ou debaixo de uma cama pelo resto da vida.
      Resgatar e transportar os gatos para um santuário ou realocá-los para um local seguro são soluções apontadas pelas pessoas ao se depararem pela primeira vez com uma colônia não assistida que sofre e causa problemas para a vizinhança. Isso é compreensível. Os gatos parecem estar em perigo e passando fome, hostilizados por parte da comunidade e é urgente removê-los dessa área de risco.
      Entretanto não existem santuários e a alocação para locais improvisados é um processo cheio de dificuldades e incerto. Ainda há a questão do que acontece quando os gatos são removidos de uma colônia. Se as condições originais são mantidas, como a oferta de comida, surge o efeito vácuo e novos gatos podem aparecer. A taxa de reposição cresce entre os animais que ficam (os que não se deixam capturar) e finalmente, apesar da realocação dos gatos, o resultado é que gatos que vivem na área serão atraídos para o local, aumentando o problema.
    • Não fazer nada
      Se nada for feito, a colonia vai crescer até sua capacidade máxima de desenvolvimento. Em outras palavras, o número de animais está intrinsecamente ligado à quantidade de comida e espaço disponíveis. Quando essa relação atingir seu limite, haverá escassez e a doença e a fome assumirão a forma de controle populacional. Isso não significa que os abrigos terão menor despesa financeira com eutanásia e outros custos. As preocupações com a saúde pública também não serão atendidas. Se a população humana cresce o número de gatos aumenta. Não fazer nada pode ser uma opção, só que é a mais dura e triste.
      Em suma, tentar resolver a superpopulação de gatos de vida livre removendo os ferais, seja para eutanasiar ou realojar, não funciona. A Natureza faz novos gatos substituírem os antigos e nada muda em termos de número ou comportamento inadequado. As proibições alimentares são cruéis e ineficazes.
      Não fazer nada significa aceitar as coisas como são e arcar com os problemas que acompanham essa atitude letárgica.
      Em última analise, interromper a capacidade reprodutiva dos gatos utilizando o método CED é o melhor caminho para reduzir o impacto ambiental e melhorar a qualidade de vida de todos.

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Kortis, Brian. Neighborhood Cats TNR Handbook, The Guide to Trap-Neuter-Return for the feral caretaker. Neighborhood Cats, 2013. 2ª edição. Capítulo 2, O que é CED?

NOTAS

  1. Nome dado a um ajuntamento de gatos em um espaço delimitado, urbano ou não.
  2. O protocolo de CED adotado pela ONG Bicho Brother determina que a devolução do animal para a colônia ocorra entre 12 e 24 horas. Para que isso possa ocorrer com fêmeas é imprescindível que a técnica de castração minimamente invasiva (CMI) seja empregada.
  3. Hoje aceita socialmente e melhor compreendida, a marcação de orelha foi no passado comparada a cortes estéticos praticados em cães, e muito repudiada quando antigas protetoras de gatos associavam a marcação à mutilação. Impossível controlar uma colônia sem esse recurso técnico, outras alternativas foram testadas sem sucesso.Muito interessante e esclarecedor é o artigo das médicas veterinárias Dras. Rita de Cassia Maria Garcia,Rosangela Ribeiro e Carolina Trochmann Cordeiro sobre a marcação de orelha escrito para a Revista Clínica veterinária nº 30. Disponível neste site.
  4. Ponto de apoio. No original encontramos caretaker, que pode ser traduzido por cuidador ou cuidadora. A pessoa que alimenta a colônia e é o elo da mesma com o resto da sociedade. É essa pessoa, via de regra, que faz a ponte entre a colônia e as ONGs, os entes públicos e as empresas. Em muitas situações é ela que “prepara” a colônia para as intervenções de CED, seguindo as orientações para a rotina de alimentação e mantendo-se calma e prestativa. Por isso se faz necessário chamar de ponto de apoio, e não simplesmente cuidadora, o que certamente teria conotação e sentido menos importantes para função tão essencial para o controle ético de gatos de vida livre. É possível dizer que em muitas situações sem o ponto de apoio não é possível o trabalho de CED.
  5. No Brasil não é possível construir abrigos ou casinhas para os gatos de colônia na imensa maioria dos lugares onde os grupos de CED operam. Não necessariamente os gatos utilizam essas casinhas para se proteger, as casinhas estragam com a ação do tempo e podem, alem de tudo, se tornar depósitos de cocô e urina. E o pior, elas chamam atenção de humanos, tornando a colônia mais exposta a maus-tratos e abandonos.
  6. A diminuição da atividade física após a esterilização têm impacto positivo sobre a fauna silvestre que eventualmente conviva com a colônia. Os gatos, predadores natos, muitas vezes passam a desprezar a caça e se alimentam de ração.
  7. Nunca é o suficiente falar da importância do ponto de apoio. Muitas vezes na forma de uma única pessoa e às vezes de um grupo, ele tem papel fundamental no controle da colônia, na manutenção e nas relações da mesma com a comunidade, os entes governamentais e as ONGs. ONGs não costumam a se arriscar a controlar colônias que não possuam um ponto de apoio. Portanto, se você procura uma ONG, um grupo ou o serviço público para resolver um problema em seu bairro ou local de trabalho, é preciso que você abra espaço em sua vida para seguir as orientações que vai receber. Fazer parte da solução de maneira direta é tornar-se um ponto de apoio.
  8. Ao alimentar animais nas ruas é dever daquele que o faz zelar pela sua segurança e bem-estar. É preciso esterilizar os animais e providenciar vacinação antirrábica. São inúmeros os exemplos de pessoas que dão comida para os animais de vida livre sem controlar a natalidade dos mesmos, agravando o problema da superpopulação e colocando em risco a saúde pública.
  9. O controle de uma colônia ocorre quando a taxa de ataque (castrações) supera a taxa de reposição (nascimento de filhotes).
  10. A realidade americana difere da brasileira em muitos aspectos. Em São Paulo, por exemplo, a lei 12.916/08 do deputado Feliciano Filho proíbe a eutanásia de animais saudáveis em centro de controles de zoonoses e canis públicos. No Rio de Janeiro a recente lei 8050/18 vai pelo mesmo caminho. As ONGs brasileiras não praticam eutanásia em animais saudáveis.
  11. No Brasil, ONGs com formato apenas filantrópico (recebem dinheiro e ajudam) têm se mostrado incapazes de resolver a questão da superpopulação dos gatos de rua, assim como o poder público. O controle ético de gatos de vida livre em nossa sociedade passa indubitavelmente pela reformulação do conceito de atuação das ONGs. Doravante as ONGs que adotarem como modus operandi o empreendedorismo social serão responsáveis por fazer o necessário controle populacional de gatos para assegurar a saúde da população humana e a diminuição do crime de maus-tratos. Prestar serviço remunerado para condomínios, clubes, hospitais privados, prefeituras, estatais e toda entidade que desejar uma atuação ética para a questão das colônias de gatos, é algo sensacional para uma ONG que detém know-how para executar o trabalho. É dessa prestação de serviço e seu excedente de remuneração que a ONG Bicho Brother, por exemplo, pode fazer controle ético de gatos de vida livre em locais sem recursos e desassistidos. Não é tirar dos ricos e dar para os pobres, é trabalhar e juntar para fazer ação social de qualidade e comprometida com o meio ambiente.
  12. Sobre abrigos para gatos, temos informações em dois artigos escritos para o Olhar Animal: Gatos de vida livre (https://olharanimal.org/gatos-de-vida-livre/) e Reflexões sobre captura e abrigos (https://olharanimal.org/reflexoes-sobre-capturas-e-abrigos/)
  13. O método CED pede pelo envolvimento total do agente com a colônia. Sua rotina, particularidades de cada gato, quais por ventura estejam castrados e sem marcação de orelha e outros detalhes significativos. Por isso a importância fundamental do ponto de apoio, que é a entidade física ou jurídica, ONG ou grupo de proteção que vive o dia a dia da colônia. Uma fêmea que acabou de parir, por exemplo, precisa de um tratamento especial se for capturada, algo que o funcionário estatal provavelmente não conseguirá proporcionar para ela e sua ninhada.
  14. Esse é um ponto polêmico quando pensamos o controle ético de gatos de vida livre dentro da realidade brasileira. As ONGs sérias que mantém abrigos estão superlotadas, os centros de controle de zoonoses e seus equivalentes nas esferas públicas não podem mais receber animais. Como devem os grupos que praticam CED nas cidades brasileiras se comportarem diante de um gato adulto bonzinho que mora em uma colônia? E diante de vulneráveis, entendendo-se esses por filhotes menores de três meses. E animais doentes? Doentes precisam ser retirados para tratamento e devem retornar. Filhotes novos devem ser abrigados para posterior adoção. A retirada definitiva de adultos e filhotes para adoção, desde que tenham temperamento dócil, deve ser parte do protocolo de trabalho, mas muito bem avaliada para assegurar que os animais não sejam confinados em casa de acumuladoras, por exemplo.O ideal é o grupo de CED criar uma rede de lares temporários, sustentáveis e que promovam adoções dentro das regras de posse responsável. Na impossibilidade disso, a regra é clara: gato adaptado fica na colônia.
  15. O que ganha alguém domesticando um animal asselvajado além do seu próprio ego inflado?Haverá o dia que essa prática deletéria e cruel será considerada crime de maus-tratos. Não há nenhum caminho a percorrer (como quer sugerir erroneamente o autor do guia da Neighborhoods Cats) que não seja o emprego do método CED para os gatos de temperamento forte, os chamados ferais, asselvajados ou assilvestrados.

Nota do Olhar Animal: Sobre o “controle biológico de roedores”, mencionado no texto, entendemos que há que se buscar métodos de controle populacional TAMBÉM para os animais desta espécie que não impliquem o terrível sofrimento imposto a eles pela predação. O fato de ser natural não significa que seja bom. Para a vítima não é. Aos animais, pouco importa quem lhes cause o dano. Não faz parte dos interesses deles sofrer ou morrer. Em 2017, a cidade de Nova York esteve testando a esterilização química de ratos. Veja em https://g1.globo.com/natureza/noticia/nova-york-testara-produto-para-esterilizar-ratos.ghtml.

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