Recorde de baleias-jubarte encalhadas no ES mostra falhas no processo de monitoramento e resgate

2017 já registra dois recordes de encalhes de baleia jubarte: o mês de julho foi o pior, desde 2002, quando o monitoramento começou a ser feito, e o mês de agosto, mesmo ainda não tendo terminado, já ultrapassou o pior ano, com 31 encalhes registrados (um a mais do que o recorde anterior), sendo 22 deles na costa capixaba.

Os dados são dos institutos Baleia Jubarte (IBJ) e Orca, com sedes na Bahia e Espírito Santo, respectivamente. As duas ongs representam, no estado, a Rede de Monitoramento e Informação de Encalhes de Mamíferos Aquáticos do Brasil (Remab), que é coordenada nacionalmente pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

No total, já são 56 encalhes, mais da metade do pior ano da história, 2010, quando foram registradas 96 encalhes, um fato totalmente atípico, que intrigou pesquisadores do mundo inteiro por três anos, até se encontrar uma resposta plausível, que foi um problema nutricional, gerado pelo aquecimento global, deixando as baleias naquele ano muito fracas, sem forças para realizar a migração anual da Antártida até o Banco de Abrolhos para a reprodução.

E o pior ainda está por vir, alerta Lupércio Araújo, presidente do Orca, referindo-se ao período entre meados de setembro e meados de outubro, quando historicamente o mais crítico. “E isso não vai parar”, acrescenta, considerando que a população de baleias-jubarte brasileira, felizmente, continua crescendo e hoje está em 20 mil indivíduos.

O caso ocorrido nesta segunda-feira (21) ilustra um pouco o dilema atual: o encalhe de uma baleia ainda viva, em Guriri/São Mateus, norte do estado. O animal ficou preso na arrebentação, sofrendo grande estresse, indo a óbito na manhã desta terça (22), quando a equipe do IBJ realizou a necropsia.

Monitoramento é pouco

“São as mesmas dificuldades de sempre: faltam equipamentos e não vai ser realizado da forma ideal”, conta Lupércio. “Devia-se pensar não só em monitoramento. E num monitoramento apenas amostral”, opina. “O modelo hoje é ruim, não envolve pesquisa e conservação. É diferente do modelo desejado, que é feito de forma mais abrangente em outros estados, como Santa Catarina e Rio Grande do Norte”, diz.

O presidente do Instituto Orca avalia que parte dos recursos utilizados atualmente no monitoramento de praias, pago pela Petrobras, poderiam ser aplicados na criação de um Fundo a ser acessado pelas prefeituras para aluguel de máquinas – guindastes, esteiras e pás carregadeiras com capacidade para 40 toneladas ou mais – e contratação de profissionais especializados na coordenação e execução de operações de resgate de baleias vivas ou mortas, bem como necropsia, remoção e enterro em local adequado.

São operações caras, cujos equipamentos e recursos não estão disponíveis em nenhuma prefeitura, responsáveis, segundo a legislação vigente, pelo tratamento do “lixo marinho”, com é classificado os corpos de baleias mortas encalhados nas praias. Lupércio cita um caso extremo, ocorrido em 2014 no final da Praia de Camburi, cujo desencalhe e enterro custou em torno de R$ 600 mil.

Um protocolo nesse sentido está sendo elaborado pelo Orca e será apresentado ao Centro de Mamíferos Marinhos do ICMBio, a quem cabe provocar a reunião das instituições numa espécie de consórcios, com definições de atribuições e modelos de atuação e financiamento.

O Fundo, acrescenta o ambientalista, também poderia financiar pesquisas voltadas à conservação desses animais, feitas pelas universidades e institutos de pesquisa, além do desenvolvimento de equipamentos necessários aos estudos e resgate, como expansores e flutuadores para desencalhar baleias, redes tracionadas, estrutura para trabalhar sobre a baleia na água com segurança (o protocolo mundial impede  que se faça qualquer trabalho junto ao corpo do animal enquanto ele não estiver totalmente fora da água) e mesmo agulhas (de pelo menos 2,5 metros de comprimento, para chegar até o coração) para realização de eutanásia, quando necessário.

Contaminação 

Lupércio avalia que as falhas do modelo atual vêm muito em função do subdimensionamento do problema, por parte das prefeituras, que não conhecem a gravidade da contaminação de uma praia pelo chorume e óleo de cadáver de baleia, por exemplo, que pode durar anos, matando os microrganismos do local e trazendo riscos aos banhistas.

A baleia-jubarte nada em alto-mar. “Quando vem pra praia, é pra morrer”, explica Lupércio. O filhote, afirma, não sobrevive longe da mãe. Eles nascem com no mínimo 500kg e engordam 100kg por dia, se alimentando exclusivamente de leite materno por seis a oito meses. Os subadultos e adultos, quando chegam na praia, é porque estão com algum problema sério – nutricional, machucado ou doença – que não os permite nadar, precisando encalhar para colocar o respirador para fora.

O pesquisador salienta que as baleias-jubarte são animais importantíssimos para o equilíbrio ecológico dos mares, e também de grande importância econômica, através do turismo de observação. O crescimento da população traz todo um potencial de geração de renda e de estudos, mas também esse aumento dos encalhes, para os quais, infelizmente, ainda não estamos preparados para lidar.


Nota do Olhar Animal: A visão de que baleias são “geradoras de renda” traz enormes transtornos e danos aos animais quando o turismo de observação é o embarcado. A começar pela possibilidade de colisão com os cetáceos. Em Santa Catarina a Justiça sspendeu esta forma de observação, hoje possível por terra.

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