Do resgate à soltura: entenda o processo de reabilitação dos peixes-boi reintroduzidos no rio Amazonas

Do resgate à soltura: entenda o processo de reabilitação dos peixes-boi reintroduzidos no rio Amazonas
Seis indivíduos voltaram ao rio Amazonas — Foto: Divulgação/Zoo Unama

Seis peixes-boi-da-Amazônia (Trichechus inunguis) voltaram à natureza na última sexta-feira (01) graças às ações de resgate, reabilitação e soltura realizadas por especialistas do Jardim Zoológico da Universidade da Amazônia (Zoo Unama).

Os animais foram soltos no Rio Amazonas, na comunidade de Igarapé do Costa, em Santarém (PA). Cerca de 45 pessoas (entre especialistas de órgãos ambientais, comunidades ribeirinhas, biólogos, veterinários e tratadores) participaram da soltura dos animais, que durou cerca de 10 horas.

De acordo com Hipocrates Chalkidis, biólogo que coordena o jardim zoológico, os animais foram resgatados em período diferentes, entre 2012 e 2015. “Todos chegaram na mesma faixa etária, entre um e dois anos de idade. Alguns foram resgatados depois de se acidentar com redes de pesca ou encontrados à deriva nas margens do rio. Na época do resgate, foram destinados ao Zoo Unama, onde realizamos os processos de reabilitação e, posteriormente, soltura”, explica.

A ação é uma parceria da rede nacional de combate ao tráfico de animais silvestres e do ZooUnama.

VÍDEO: Peixes-boi-da-Amazônia voltam para o rio depois de anos de reabilitação

Etapas da reabilitação

A chegada dos filhotes ao centro de reabilitação dá início a uma etapa delicada do processo. “Eles passam por análises clínicas de veterinários e biólogos e começam o primeiro estágio, que dura de dois a três anos, quando se alimentam exclusivamente de leite. É um período crítico do processo, porque ainda estão se adaptando às condições do recinto”, diz.

“A segunda fase da reabilitação dura de um a dois anos e os animais começam a se alimentar também de macrófitas aquáticas, fase importante para ter contato com a vegetação do habitat em que será solto. Já a terceira fase, quando o peixe-boi está adulto, dura até três anos e eles se alimentam só de plantas aquáticas”, detalha Chalkidis.

O peixe-boi-da-Amazônia está ameaçado de extinção na categoria ‘Vulnerável’

Adaptados ao longo período nas piscinas do zoológico, os animais são transferidos para uma base flutuante, onde conhecem as condições físico-químicas do rio, como temperatura, PH e sedimentos da água. “Esse período pode durar de um a três anos. Em seguida, realizamos a soltura”.

Os animais voltaram às águas do rio Amazonas na sexta-feira (01/07) — Foto: Zoo Unama/Divulgação
Os animais voltaram às águas do rio Amazonas na sexta-feira (01/07) — Foto: Zoo Unama/Divulgação

Nova chance

Na última sexta-feira além dos seis animais que voltaram à natureza, outros seis passaram para a última fase do processo de reabilitação: foram transportados das piscinas para a base flutuante. “No caso desses indivíduos reintroduzidos, o processo teve parceria com a Marinha, com a Secretaria de Meio Ambiente e o Zoounama”, destaca.

O transporte dos animais contou com uma logística elaborada: das piscinas para o flutuante, na comunidade que fica a duas horas de Santarém, os peixes-boi foram levados pelo caminhão dos bombeiros. “É um desafio grande, porque são animais pesados que requerem cuidado extremo, e que estão ameaçados. Então todo cuidado é pouco, por isso contamos com a atuação de muitas pessoas”.

Cerca de 45 pessoas participaram do processo de soltura — Foto: Divulgação/Renctas
Cerca de 45 pessoas participaram do processo de soltura — Foto: Divulgação/Renctas

Monitoramento e adaptação

Um dos seis peixes-boi reintroduzidos no rio Amazonas está sendo monitorado por um rádio-transmissor, equipamento adquirido graças à parceria com a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres – Renctas. “A ideia é elaborar mapas que permitam identificar os locais usados pelos animais. Assim, indicaremos os pontos onde é necessário evitar trânsito de barcos e uso de redes. O envolvimento de órgãos ambientais e da comunidade é fundamental nesse processo de conservação”.

“Nossa expectativa quanto à soltura desses animais é a melhor possível, levando em consideração a experiência que temos sobre a manutenção dos peixes-boi. Sempre existirá risco de não adaptação, mas podemos minimizá-lo, uma vez que fizemos um trabalho elaborado de educação ambiental nas comunidades do entorno. As chances de predação ou captura desses animais são muito pequenas”, finaliza o biólogo.

Os animais foram reintroduzidos depois de passar pela reabilitação — Foto: Divulgação/Renctas
Os animais foram reintroduzidos depois de passar pela reabilitação — Foto: Divulgação/Renctas

Exclusivo da bacia Amazônica e ameaçado de extinção

O peixe-boi-da-Amazônia está ameaçado de extinção na categoria ‘Vulnerável’, de acordo o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, do ICMBio. Estimativas indicam a morte de até 140 mil animais vítimas da caça indiscriminada entre os anos de 1935 e 1954. A redução populacional também tem como causa a captura acidental de filhotes em redes de pesca, principal ameaça hoje; além da degradação do habitat, que prejudica muito os peixes-boi, já que dependem de áreas conservadas.

Encontrado nos principais rios da bacia Amazônica, de onde é endêmico, o peixe-boi-da-Amazônia ocorre no Peru, Equador e Colômbia, além do Brasil, onde pode ser visto nos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Roraima e Rondônia. A espécie vive em águas com temperatura acima de 23 graus, em rios de águas brancas, pretas e claras.

Com até 2,75 metros de comprimento e cerca de 420 quilos, é o menor representante da ordem Sirenia (a mesma do peixe-boi-marinho, peixe-boi,aricano e dudongo). Herbívoro, se alimenta de mais de 50 espécies de plantas aquáticas e semiaquáticas. Veja mais algumas curiosidades da espécie:

  1. Consome o equivalente a 8% do peso do corpo em alimento, por dia
  2. No período de seca pode passar por jejum prolongado
  3. A gestação dura cerca de 12 meses e os filhotes costumam nascer na época da cheia dos rios, quando a oferta de alimento é maior
  4. Os peixes-boi são os únicos mamíferos aquáticos herbívoros do Brasil

Por Giulia Bucheroni

Fonte: g1

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