Ética e diversidade
Se um holismo totalitário, por defender a preservação e integridade de um sistema sem levar em conta os valores que tal sistema fomenta, não pode servir de fundamento para sustentar uma ética animal e ambiental genuínas, o conceito de diversidade também não pode ser usado levianamente, quando se quer redefinir os valores sobre os quais sustentar tal ética.
A diversificação, por si só, não basta para imbuir valor em alguma coisa. O fato de ela ser algo que não se repete, também não. Vejamos alguns casos, nos quais a diversidade não é considerada algo bom: vírus sofrem mutações, criam estratégias de sobrevivência inexistentes, aumentando a diversidade dos sintomas ou doenças que originam. Isso não é algo que possa ser considerado moralmente bom. Fabricantes inventam novas combinações químicas, criando drogas novas para atender à demanda humana por aditivos que mudam o estado da consciência. Isso aumenta a diversidade da oferta e propicia também experiências psicológicas e emocionais diferentes das causadas pelas drogas conhecidas. Tal diversidade de oferta não pode ser considerada moralmente boa. Poderíamos estender essa listagem ad infinitum, mas não é preciso.
Do mesmo modo, quando se trata da ética animal e ambiental, não podemos ficar no conceito raso de diversidade, caso queiramos sinceramente que a vida continue a existir em nosso planeta e que seja boa para todos que nela aparecem. Quando se defende a diversidade biológica, a ênfase deve ser dada à singularidade do viver que a diversidade proporciona. Nesse sentido, o valor da vida não se reduz à diversidade na qual ela toma forma. O valor moral da vida se constitui por sua especificidade singular, por expressar o mistério da preservação do próprio existir numa forma que não se repete.
Mas, pode-se alegar, há formas nas quais a vida se expressa, que não são benéficas para os seres humanos, para os animais e para os vegetais. É verdade. Da perspectiva ética, no entanto, o que deve ser levado em conta é a estruturação ambiental na qual um determinado tipo de vida se mostra maléfico a outros. No senso comum da ciência, usava-se o termo “daninha”, para ervas, e “praga”, para insetos ou micro-organismos que atacam e eliminam outras vidas para suprirem as próprias.
Se o ambiente no qual a espécie de vida se mostra “daninha” for alterado e esta puder obter os nutrientes necessários à sua subsistência sem roubar a vida de outras, ela deixa de ser uma “praga”, deixa de ser “daninha”. Michael Schmidt (Gorduras inteligentes), Daniel Amen (Transforme seu cérebro, transforme sua vida), Russell Blaylock (Excitotoxins), Carol Simmontacchi (Crazy maker’s) alertam para o fato de que boa parte da delinquência infantil, juvenil e adulta está diretamente associada à carência de ômega-3 na dieta, ou a lesões em certas áreas do cérebro, produzidas até por pequenos acidentes sofridos na infância. Os crimes e a violência produzidos por essas pessoas são considerados “daninhos” à paz social. Se o ambiente alimentar dessas pessoas fosse redesenhado, e se elas recebessem orientação sobre como cuidar do seu cérebro, tais danos não existiriam e suas vidas não seriam consideradas sugadoras da paz e da felicidade geral. A violência pode ser considerada também da perspectiva da “diversidade” de vidas que produz. Nem por isso é algo moralmente bom.
Estamos acostumados a defender a “diversidade biológica”, na ética, na biologia e na política ambientalista, mesmo quando o tempo todo usamos meios para exterminar a vida diferente que nos causa danos ou ameaça de morte. Temos uma perspectiva ética bélica. Assumimos o comando e o controle sobre a vida que pode continuar e sobre a que deve acabar. Os antibióticos são a prova evidente desse poder que temos. A pena de morte e a prisão, também.
Mas, se quisermos superar a “moralidade heroica”, essa que espera a catástrofe abater-se para somente então arrebanhar forças para combater o mal que ela produz, é preciso começar a redefinir a ética segundo um padrão de “cuidado”, no sentido de “prevenção”. Mantendo saudável o ambiente no qual a vida se delineia de formas diversas, estamos mantendo o princípio da biodiversidade. É preciso respeitar os princípios sugeridos por Paul Taylor (Respect for Nature, 1986), de não interferência, não maleficência, fidelidade e justiça restitutiva, caso estejamos sinceramente interessados em manter a biodiversidade em nosso planeta.
Fonte: ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
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