Famoso templo tailandês de tigres foi fechado, mas o problema só piora
Quando guardas florestais tailandeses invadiram um famoso zoológico popular que deixou visitantes alimentarem e manejarem tigres, suas descobertas de três anos atrás chocaram o mundo: 1.600 partes de tigres, incluindo peles, amuletos feitos de peles, dentes, 40 filhotes mortos encontrados em um freezer e mais 20 preservados em potes.
Por trás da fachada de um Templo de Tigres, um zoológico gerenciado por monges budistas, havia um negócio que lucrava com o tráfico ilegal de partes de tigres. Três monges foram presos ao tentarem escapar e, em um espetáculo altamente publicado, 147 tigres foram apreendidos e levados para uma instalação sob responsabilidade do governo.
As invasões foram um ponto alto para a Tailândia em seu esforço para reprimir maus-tratos a animais e o comércio ilegal de tigres e de suas partes. Mas, desde então, a situação dos tigres em cativeiro só piora.
Os funcionários admitiram no mês passado que 86 dos tigres apreendidos morreram sob seus cuidados, muitos por causas relacionadas ao estresse. Ninguém do Templo dos Tigres foi preso por possuir partes de tigres ou por operar o lucrativo zoo sem licença.
Nos últimos anos, o número de tigres em cativeiro (incluindo aqueles que permanecem sob custódia do governo) triplicou para cerca de 2.000, e o número de instalações com tigres cativos cresceu para 67, com mais dois em construção, disse Edwin Wiek, fundador do Wildlife Friends Foundation Thailand.
Desde as invasões, o Departamento de Parques Nacionais não fez nenhum esforço para acabar com a propagação das experiências de visitantes com animais que o templo ajudou a abrir caminho. Agora, ao menos 20 zoológicos em todo o país oferecem aos visitantes a chance de alimentarem um filhote, tirarem uma foto com um tigre ou entrarem em uma jaula.
Ativistas do bem-estar animal há tempos pedem que o governo feche esses zoológicos de tigres que não são mais do que fazendas que produzem animais para o mercado negro.
“Todo o sistema de bem-estar animal precisa ser atualizado na Tailândia”, disse Tanya Erzinclioglu, que cuidou de tigres no Templo antes de se tornar uma ativista dos direitos dos animais. Eles precisam de padrões apropriados para zoológicos. Todo mundo teria que se atualizar, inclusive o Departamento de Parques Nacionais”.
Um dos maiores e mais antigos zoológicos do país, o Sriracha Tiger Zoo, possui mais de 300 tigres.
Lá, leitões e filhotes de tigres são colocados juntos nas jaulas. Os leitões e filhotes menores mamam juntos em uma porca ou às vezes em uma tigresa, um eco do mantra de marketing do Templo dos Tigres sobre a coexistência pacífica entre as espécies.
Em uma exibição chamada “Shoot ‘n Feed” (atire na comida), turistas atiram com armas de pressão em alvos acima de uma jaula de tigre. Ao acertar, comida é liberada para os tigres que aguardam, e que lutam por causa das sobras.
Em outro lugar, visitantes fazem fila para tirar fotos enquanto dão mamadeira para filhotes. Ou eles podem assistir a um show onde tigres fazem performances, como pular por um arco em chamas.
Depois da invasão no Templo dos Tigres, Erzinclioglu fundou uma organização sem fins lucrativos, For Tigers, para ajudar a angariar fundos para o bem-estar dos animais e começou a fazer pesquisas anuais em zoológicos.
Em um relatório de julho, após verificar três dúzias de zoológicos abertos ao público, ela concluiu que os tigres em 74% das instalações eram mantidos em condições inadequadas.
Cerca de 60% dos zoológicos não tinham água fresca para os tigres, e menos de 20% forneciam locais espaçosos onde os animais poderiam se mover sem restrição ou interferência de humanos.
Em alguns zoológicos, os tigres foram treinados para terem medo de ser agredidos com uma vara. Muitos tiveram suas garras removidas.
Erzinclioglu e sua equipe contaram 28 tigres em diferentes zoológicos que eram mantidos em correntes curtas durante horas por dia para que os turistas pudessem posar com eles para fotos.
“Há mais instalações com tigres do que antes do Templo dos Tigres ser fechado”, ela disse. “Há alguns lugares bons, mas, de um modo geral, eles são muito ruins”.
Os zoológicos atendem principalmente turistas de países asiáticos.
Tigres jovens são os mais populares com os visitantes. Tigres mais velhos já não têm mais utilidade, e são frequentemente colocados longe de serem vistos, em jaulas menores com chão de concreto. Eles são os mais vulneráveis ao comércio ilegal.
Não é difícil reproduzir tigres em cativeiro, e muitos zoológicos reproduzem muitos mais tigres do que precisam para entreter os turistas.
Entretanto, é ilegal operar uma fazenda de tigres na Tailândia. Wiek, que vem rastreando o comércio por anos, diz que cerca de 20 instalações deveriam ser consideradas fazendas e não zoológicos, porque mais de 80% de seus animais são tigres e as instalações dedicam-se ativamente à sua reprodução.
E mais, ele disse, a reprodução em cativeiro encoraja a caça de tigres selvagens.
Parece contraproducente, mas alimentar e criar um tigre até idade adulta custa mais na Tailândia do que ir para a floresta e atirar em um. Wiek disse que a existência das fazendas de tigres cria um mercado para as partes desses animais, o que dá aos caçadores um incentivo para matá-los.
Além disso, ele disse, os compradores pagarão mais por um tigre selvagem do que por um que nasceu em cativeiro.
“A reprodução de tigres em cativeiro está causando um efeito direto na população selvagem”, disse Wiek, que opera um centro de resgate de vida selvagem e já aconselhou o parlamento sobre o assunto. “É muito mais barato ir e matar um na selva”.
Peles, ossos, pênis e outras partes de tigres são altamente desejadas na China e Vietnã, particularmente para uso na chamada medicina tradicional.
O comércio de partes de tigres opera tão livremente que ao menos uma companhia oferece abertamente aos turistas estrangeiros pó de ossos de tigre como um suposto suplemento para a saúde, Wiek disse.
“Eu não me lembro de nenhum caso onde um zoo que foi pego por tráfico ilegal ou posse ilegal chegou realmente a perder sua licença”, ele disse.
A diretora da Agência de Conservação de Vida Selvagem da Tailândia, Kanjana Nitaya, que inspeciona os zoológicos, disse que todos os zoos do país atendem aos requisitos de suas licenças.
Inspetores frequentemente visitam os zoos e examinam a saúde dos tigres, que eles consideram satisfatória, ela disse.
Ao contrário do Templo dos Tigres, que fechou porque não tinha licença, outros zoos que oferecem interações com turistas receberam sanções porque possuem licenças, ela disse.
O papel do departamento não é regular o que os zoológicos fazem com seus animais, ela disse, mas garantir que os animais sejam cuidados de forma adequada.
“Não é nossa função dizer quais atividades eles devem desempenhar”, ela disse.
O World Wildlife Fund estima que há 3.900 tigres selvagens restantes no planeta, habitando fragmentos isolados de sua faixa histórica.
Cerca de 3.000 estão na Índia, que está fazendo um esforço preocupado para proteger seu habitat e aumentar seus números.
A Tailândia é um dos poucos países restantes no sudoeste da Ásia com uma população viável de tigres selvagens, com números ao redor de 250. Uma pequena população de tigres foi descoberta recentemente em uma região do norte da Tailândia onde eles não estavam mais presentes por anos.
“São boas notícias para a Tailândia”, disse Tim Redford, coordenador de treinamento da Fundação Freeland, um grupo ambientalista e de direitos humanos. “Ainda há tigres que procriam aqui. Ainda não é uma causa perdida”.
Se a reprodução em cativeiro se tornar o último recurso para salvar os tigres, a maioria dos tigres cativos da Tailândia não seria bons candidatos.
Muitos são consanguíneos, e a maioria é uma mistura de subespécies de tigres, incluindo os tigres Amur, que são nativos da Sibéria e do norte da China, e tigres de Bengala, que são nativos da Índia.
Dentre aqueles em cativeiro, há relativamente poucos tigres indochineses, a subespécie nativa da Tailândia.
No mês passado, os funcionários culparam as mortes dos 86 tigres do templo pelo fato de que muitos são consanguíneos e que alguns já estavam doentes quando foram apreendidos em meados de 2016.
Mas deveria ser procedimento padrão deixar tigres doentes em quarentena quando chegam. Ao invés disso, eles foram colocados em jaulas relativamente pequenas e próximas umas das outras, onde doenças contagiosas poderiam facilmente se espalhar.
No último dia 20, funcionários convidaram jornalistas para o Centro de Reprodução em Cativeiro Khao Prathap Chang em Ratchaburi, umas das duas instalações onde os tigres do templo foram mantidos.
O grupo viu dois tigres que devem ter sido do templo em meio a corredores de jaulas vazias.
“Eu quero que eles tenham uma vida ótima, felizes e que vivam por muito tempo”, disse o diretor do centro Banpot Maleehuan. “Eu nunca os negligencio.”
Talvez, a melhor estratégia para fechar zoológicos e fazendas de tigres de má reputação seja castrar os tigres consanguíneos e mestiços, sugeriu Wiek e Redford.
A falta de novos filhotes diminuiria as oportunidades para alimentá-los e tirar fotos. E, em 15 anos ou mais, muitos dos problemas associados aos zoológicos e fazendas de tigres desapareceriam.
“É a solução”, Wiek disse. “Quando você não consegue aplicar as leis que possui ou as pessoas são muito corruptas, esta é, provavelmente, a única forma de acabar com a reprodução em cativeiro desses tigres”.
Tradução de Alice Wehrle Gomide
Fonte: Bangkok Post