Quem responde pelo abandono de cavalos ou de outros animais?

Por Dr. phil. Sônia T. Felipe 

Não é certo que as pessoas que nunca fizeram uso de cavalos (também serve para gato, cão etc.) seja lá para qual finalidade for, agora sejam responsabilizadas pelo abandono deles quando não “servem” mais ao propósito dos humanos que uma vez os “possuíram” e “usaram”. Quem usa deve responder. Se não há políticas públicas de responsabilização das pessoas pelo uso de animais, acabamos por ter esse desastre instalado: uso e descarte quando não serve mais ao uso.

Então, quem usa cavalos é que deve responder pela prática do abandono de cavalos em geral. Quem não os usa e nem os usará, deve fazer o trabalho de conscientizar as pessoas para que não ponham na cabeça essa ideia especista eletiva de montar um animal e maltratar seu corpo e sua alma, descartando-o na doença ou velhice.

Coletar e dar abrigo aos animais descartados por seus “donos” não é a única responsabilidade humana na defesa dos animais. Dizer-se defensor dos animais por coletar animais de uma espécie, quando a mesma pessoa é uma das que fomenta a prática que leva ao descarte do animal quando ele não “serve mais”, e cobrar de pessoas que não fazem qualquer uso do animal que venham socorrer os animais descartados é pedir que outras pessoas se responsabilizem pelos atos de quem usa e possui animais. É pedir que quem usa e descarta seja desresponsabilizado, pois empurra o peso da responsabilidade para os ombros de quem não fomenta a prática.

Defender os animais não é apenas sair dizendo que se é defensora ou defensor dos animais. Quem defende, mesmo, não usa, não abusa, não explora e não mata. E quem já aboliu tudo isso de sua vida, luta para que quem ainda não tomou consciência o faça logo, e com isso cuide de todos os animais que ajudou a tornar inúteis, justamente pelo uso que os gastou.

Quem é abolicionista não “possui” animal algum que um dia possa vir a abandonar. Cuidará do animal que escolheu forçar à sua companhia, até a morte, a própria, ou a dele. Mas essa pessoa não tem que responder pelo ato das que usam os animais para seu gozo pessoal e depois os descartam. E o abandono de animais cresce justamente porque há quem responsabilize as pessoas que não usaram os animais descartados, por esse descarte. Há algo profundamente errado nisso. E os violadores e abandonadores estão por aí, livres da responsabilidade pelo animal que usaram e gastaram.

Só quem “possui” um animal é capaz de abandoná-lo. Eu não abandono animais nem respondo pelo abandono alheio, porque eu não “possuo” animal algum. E, apesar disso, faço o que posso para que muitas pessoas tirem da ideia o gosto de usar cavalos, ou seja lá qual outro animal for, para seus propósitos pessoais. Mesmo que os acariciem, lhes deem comida, água, abrigo e medicina.

Cavalos podem obter o carinho de outros cavalos, se forem deixados livres, sem serem montados. E tratar com carinho deles não dá direito algum a um humano de montar neles. São duas coisas bem distintas. Tem gente que trata bem de sua cadela para depois usá-la com propósitos sexuais. Tratar bem é um dever moral. Não institui direitos para o sujeito, apenas para o paciente moral.

Cavalos não montados, se cuidados por pessoas que foram responsáveis por sua monta um dia, podem seguir seu espírito e buscar conforto na presença de outros de sua espécie que estão na mesma frequência mental e espiritual deles.

A gente só entrou na história deles para atrofiar algo neles até que eles passaram a servir direitinho ao nosso propósito. E esse propósito sempre está vinculado a tracionar peso alheio sobre seus lombos, seja carga inerte, seja humana.

E as pessoas que jogam fora seu animal creem que quem uma vez coletou um animal abandonado precisa ter outros para coletar, senão se sente inútil ou uma pessoa que “não ama os animais”. E, por isso mesmo, elas continuam a usar e a descartar “seus” animais para os outros coletarem, feito saquinho de lixo jogado para o quintal da vizinha. Se ela vai lá e cata o saquinho todo dia, todo santo dia o sujeito vai jogar seu saquinho de lixo para ela catar e botar na lixeira que o caminhão esvaziará.

Essa é a melhor maneira de desresponsabilizar o sujeito que age, através da ação de quem acolhe a ação do primeiro. É isso o que está acontecendo com a “proteção” animal. Os abandonadores não estão sentindo qualquer responsabilidade, porque vigora o discurso de que se alguém não for lá coletar o saquinho atirado fora, esse alguém não tem amor pelos animais. Vai lá, ajuda o animal. Socorre o animal. Abriga o animal. E identifica seu “ex-dono”.

Se ele não quiser cuidar do animal, deve pagar pensão alimentícia para quem o faz. Na justiça. Mas sem o registro de “dono por dono”, quem socorre arca com o ônus da manutenção do animal descartado até sua morte. E isso não custa pouco dinheiro não.

Está na hora de mudar o modo de agir em relação ao descarte e ao abandono. E registro de todos os animais detidos na companhia dos humanos é algo urgente de se fazer. E depois disso ainda teremos muito trabalho para educar toda gente a não querer mais comprar animais ou forçá-los a se reproduzirem para atender a propósitos humanos. O único propósito da vida de um animal deveria ser o de viver a vida ao seu próprio modo, em paz. Sem intromissão alguma dos humanos.

Solução? Abolição do uso de cavalos, cães, gatos etc. para quaisquer fins humanos. Demora? É difícil? Com certeza! Mas para que viver 60 ou 90 anos, senão para corrigir os próprios erros passados e ajudar outras pessoas a não repeti-los? Sim, dois erros não fazem um acerto.


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