Sem carroças! Justiça mantém proibida a tração animal em Guarulhos, SP

Sem carroças! Justiça mantém proibida a tração animal em Guarulhos, SP
Foto meramente ilustrativa.

A Justiça de São Paulo julgou IMPROCEDENTE a ação proposta pela Associação dos Cavaleiros de Guarulhos que, alegando inconstitucionalidade, pretendia invalidar o artigo 60 da lei nº 7839/2020 (Código de Proteção e Bem-Estar Animal), que proíbe a condução de veículo de tração animal no município.

A autora da ação afirma que a lei fere uma tradição e o direito de ir e vir, pois “em muitas regiões além de ser cultural os veículos de tração animal, muitas pessoas ainda utilizam estes veículos de tração animal como meio de locomoção entre as propriedades rurais e os pequenos comércios locais”. A Associação pede à Justiça que declare o direito de charreteiros e carroceiros circularem em Guarulhos com veículos de tração animal com base no artigo 52 do Código Brasileiro de Trânsito – CTB (Lei Federal 9503/1997), que define normas de circulação e conduta referentes aos veículos de tração animal no país.

Porém, em sentença proferida no último dia 15, o juiz Rafael Tocantins Maltez, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Guarulhos, afirma que inconstitucional é o artigo 52 do CTB, por ser incompatível com o artigo 225, § 1º, VII da Carta Magna. Diz o juiz que “o município tem competência para proibir veículo de tração animal, uma vez que intensificou a proteção dos animais, constitucional e legalmente determinada.”

Na sentença, o magistrado faz uma retrospectiva da evolução do direito animal no Brasil até fatos recentes, como a decisão do Tribunal de Justiça do Paraná admitindo a possibilidade dos animais não humanos serem parte em ações judiciais. Também menciona os avanços do direito animal pelo mundo e a Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não Humanos, divisora de águas em relação ao reconhecimento da senciência animal. Em sua manifestação, o juiz indica que, constatada a crueldade, nenhum outro direito deve se sobrepor para validá-la e que valores culturais não são mais importantes do que a dignidade do animal, já reconhecida pela lei.

“Alega o autor que o uso de veículos de tração animal, no caso charretes, constituem uma tradição e uma forma de preservação cultural, além de serem utilizadas, em menor grau, para o deslocamento de pessoas entre as propriedades rurais e os pequenos comércios locais, no geral afastados do centro nervoso da cidade. Conforme visto, está totalmente superada a discussão a respeito da possibilidade de utilização de animais em práticas ditas “culturais”, mas que sejam cruéis. Onde há crueldade, não possibilidade de prática cultural. Onde há cultura, não pode haver crueldade. O STF já decidiu diversas em ações envolvendo rinhas, farra do boi e vaquejada, que as práticas culturais não justificam atos cruéis. A CF [Constituição Federal] veda expressamente a crueldade e não abre nenhuma exceção. A utilização de animais em atividade de tração é intrinsecamente cruel e implica necessariamente maus-tratos. E mesmo que assim não se entenda, foi dada oportunidade ao autor de produzir prova no sentido de ausência de crueldade ou maus-tratos, contudo, não se manifestou no sentido de produção de prova e requereu o julgamento antecipado.”, diz o juiz em seu texto.

O julgador contesta o tratamento dispensado aos animais como se fossem objetos e fundamenta sua decisão citando estudos que atestam os maus-tratos aos cavalos explorados para a tração que apontam tanto os danos intrínsecos à atividade quanto os decorrentes da negligência dos tutores. Neste ponto destaca: “…Com os estudos supracitados, a atividade de carroças, em si, coloca os animais em situação de inerentes maus-tratos, quando a negligência humana não agrava ainda mais a situação. Até poder-se-ia refletir se haveria como ter uma carroça sendo puxada diariamente em ambiente urbano sem ocorrência de maus-tratos, contudo a vida real tende a nos dizer que não. Quando falamos do animal que puxa a carroça, temos que ter consciência que não é um objeto, um motor. O animal que puxa a carroça é um mamífero com percepções complexas e com grande sensibilidade sensorial e comportamentais de dor, percepções escamoteadas ao longo da história por nossa ignorância para com esses animais. Cabe esclarecer que equinos são animais que aguentam dores atordoantes sem demonstrar que estão a sofrer. Quando alguém que não tem conhecimentos sobre cavalos nota que este está sofrendo, provavelmente, o animal já está num quadro de dor ou exaustão muito avançado. Portanto, conclui-se como sendo inerente a crueldade atrelada à atividade da carroça”.

Cabe recurso contra a decisão de 1a. Instância.

Para ler a sentença na íntegra, CLIQUE AQUI. Ou acesse o processo digital nº 1019658-68.2021.8.26.0224.

Fonte: Olhar Animal

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