Tartarugas-verdes sofrem com tumor provocado por infecção viral na Baía de Guanabara

À primeira vista, a imagem encanta. Tartarugas-verdes nadam na Baía de Guanabara, em um dia de águas claras, às margens da Marina da Glória. Conferida mais de perto, a cena é chocante: os animais aparentemente estão tomados por fibropapilomatose, tumor provocado por uma infecção viral que pode fazer com que percam a visão, os movimentos e a vida.
— A suspeita é de uma infecção que pode ocorrer associada a fatores ambientais. A fibropapilomatose se caracteriza pelo aparecimento de inúmeros tumores na pele do animal, que também podem afetar os órgãos internos — alerta Rafael Franco, biólogo marinho e gerente técnico do AquaRio. — Infelizmente, casos assim são comuns e prejudicam muito a saúde do animal. Podem aparecer feridas também, que passam a ser outra entrada de bactérias. Afetam a mobilidade, a visão e a alimentação.
Bruno Meurer, coordenador do Núcleo de Ciências Biológicas da Universidade Santa Úrsula, explica que a fibropapilomatose é uma doença caracterizada pela presença de múltiplos tumores benignos, muito semelhante à herpes.
— Não há nada que comprove que isso seja causado por poluição, mas existem hipóteses de que a poluição possa trazer baixa imunológica para as tartarugas marinhas, o que faz com que o vírus se manifeste. Assim como a herpes, quando temos o vírus, se manifesta em nós — explica. — Mas é claro que um ambiente marinho equilibrado e não poluído pode manter um sistema imunológico equilibrado e prevenir essas doenças.
Ainda que na intenção de ajudar, alguns pescadores buscam retirar os tumores, que parecem verrugas. Meurer avisa que isso não deve ser feito.
— É muito importante não arrancar esses tumores porque a infecção no ambiente marinho acontece de forma rápida e intensa, as bactérias se proliferam rapidamente.
Ele é enfático em dizer que a Baía de Guanabara é o lugar do Rio com mais armadilhas para as tartarugas. E a ameaça não é só o canudo, vilão flagrado em imagem que viralizou e comoveu o mundo.
— Os resíduos sólidos são os maiores vilões. Plástico de uma maneira geral. Além da poluição, (a baía) é um lugar que tem muito resíduo sólido, o animal se alimenta desse lixo e morre — diz Meurer, ressaltando que essa é uma responsabilidade compartilhada. — Todos têm que cuidar para que o lixo não chegue ao mar. Por ser uma espécie carismática, as pessoas se sensibilizam com a causa. Mas, se a população evitar que o lixo chegue ao mar para cuidar da tartaruga marinha, vai estar salvando outras espécies também.
O biólogo Mário Moscatelli responsabiliza projetos malsucedidos de despoluição da Baía de Guanabara e propõe soluções para atacar o problema. Em sua lista, estão a aplicação severa das leis ambientais, melhorias no saneamento, instalação das 17 ecobarreiras (apenas 4 estão operando) e campanhas educativas.
— Nada disso foi prioridade do poder público. Afinal, é da desordem que vêm o lixo e muito do esgoto que fluem pelos rios e atingem a baía e sua fauna — diz. — Não há mágica para combater as consequências de décadas de impunidade e delinquência ambiental generalizada. O monstro é grande, mas podemos abatê-lo.
Boa notícia
Uma novidade reforça a esperança de Moscatelli: em junho deste ano, a tartaruga-verde e outras três espécies de tartaruga marinha saíram da Lista Oficial das Espécies Brasileiras Ameaçadas de Extinção, do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Por Marcella Sobral
Fonte: Extra