O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Para o mundo de hoje, os sistemas de exploração e abuso estão cada vez mais obsoletos e cada vez mais pessoas aderem aos protestos contra sistemas e estruturas de exploração que acabam por transformar tudo o que tocam em mercadorias. Um dos movimentos que está crescendo rapidamente em todo o mundo é o Movimento de Libertação Animal, movimento abolicionista de libertação animal ou simplesmente movimento animalista.

Estes movimentos baseiam-se na ideia de que os animais ou seres não humanos são capazes de sentir prazer e dor, por isso os animais devem ser sujeitos de direito e, como qualquer ser humano, merecem ter leis que garantam o seu bem-estar. Parte da preocupação dos simpatizantes desses movimentos é lutar para que os animais tenham seu direito à vida garantido, mas acima de tudo, conduzi-lo com dignidade e liberdade.

Para o movimento de libertação animal, é importante que os diferentes países onde se desenvolve tenham leis que garantam o “bem-estar animal”, termo que designa o estado físico e mental de um animal em relação às condições em que vive e morre. Os ativistas têm procurado a aprovação de leis para que os animais, independentemente do setor em que se encontrem, possam se desenvolver num ambiente saudável, com alimentação adequada, confortável e segura.

Um aspecto importante a notar é que os defensores dos direitos dos animais mantêm uma postura anti-especista e estão normalmente, embora não exclusivamente, ligados ao veganismo ou ao vegetarianismo, também procuram quebrar as barreiras que separam os seres não humanos dos animais. O termo especismo refere-se à discriminação contra aqueles que não são membros de uma determinada espécie. É o favorecimento injustificado de quem não pertence, neste caso, à espécie humana, ações como abusos, maus-tratos e comércio são vistas como especistas. Membros de movimentos pró-animais têm procurado a proibição da utilização de animais em eventos recreativos, exposições em jardins zoológicos, investigação e alimentação, procurando acabar com todos os aspectos de subjugação e abuso de poder.

No México há atualmente um grande número de manifestações e protestos a favor dos direitos dos animais, um dos mais importantes para ativistas, associações e sociedade em geral é a Marcha Nacional Cidadã pelos Direitos dos Animais comemorada no dia 30 de junho.

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Felizmente no México, embora aos poucos, começaram a ser observados progressos na legislação sobre os direitos dos animais, pois recentemente na Cidade do México foi possível reconhecer os animais como seres sencientes, além de passarem de animais domésticos a animais de companhia. Também na Cidade do México foi estabelecido o Cadastro Único de Animais de Companhia (RUAC), que busca ser um sistema de identificação semelhante ao CURP que busca dar identidade tanto aos seres sencientes quanto aos seus tutores, a fim de garantir o bem-estar animal, nutrição, ambiente saudável, saúde, comportamento e estado mental.

O abuso contra animais, atos pouco castigados

No México, o movimento pelos direitos dos animais está aumentando, cada vez mais pessoas estão interessadas em salvaguardar a segurança das espécies ameaçadas, mas o número de pessoas que apoiam os direitos dos animais também está crescendo.

Apesar do movimento que está ocorrendo, os números em relação ao abuso de animais não são muito animadores porque segundo o estudo “Abuso de animais e suas sanções no México” realizado pelo pesquisador César Alejandro Giles Navarro do Instituto Belisario Domínguez, estima-se que sete em cada 10 animais no México são vítimas de alguma forma de abuso, da mesma forma que se estima que o México é o primeiro país da América Latina em abuso de animais e o terceiro no mundo.

No México parece que os casos de maus-tratos contra animais não estão diminuindo, pelo contrário, os casos de maus-tratos a animais conhecidos nas redes sociais estão se tornando mais frequentes e gerando grande indignação na população. Há exemplos desses casos em que nem sempre se chega a uma sentença para quem comete os atos, nos últimos tempos temos alguns exemplos.

Em 28 de maio de 2023, um caso terrível chocou o México. Segundo relatos, um homem identificado como Sergio “N” discutiu em um açougue e ao sair jogou um cachorro conhecido como “Scooby” em uma caixa com óleo fervendo, acabando assim com a vida do animal. Os acontecimentos ocorreram em Tecámac, Estado do México. Algum tempo depois, o sujeito foi preso na prefeitura de Coyoacán, na Cidade do México. A Procuradoria Geral do Estado do México (FGJEM) proferiu pena de 5 anos, 7 meses e 15 dias de prisão, além de multa de 38.902 pesos (cerca de R$ 11.500), também terá que reparar os danos em favor do Fundo de Proteção a Animais do Estado do México pelo valor de 28. 217 pesos (cerca de R$ 8 mil).

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Em junho de 2023, houve o caso de Huellitas, cachorro que foi adotado pelos alunos do Centro de Bacharelado Tecnológico Industrial e de Serviços 86 (CBTIS) de Huachinango, Puebla. Foi relatado que o cachorro morava no campus, mas mais tarde foi adotado por uma aluna do instituto, Vanessa “N”. Algum tempo depois a aluna compartilhou fotos e vídeos mostrando a tortura do animal que acabaria perdendo a vida, os vídeos e fotos rapidamente se espalharam assim como mensagens onde ela comentava com amigos sobre o que ela havia feito com o cachorro Rapidamente surgiu grande indignação entre a população, mas apesar de haver denúncias, a Procuradoria-Geral do Estado de Puebla determinou que a menor fosse libertada da custódia e recebesse atendimento psicológico, para que ela não ficasse confinada numa prisão ou num centro para menores.

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Um dos casos mais recentes ocorreu em 15 de maio deste ano, quando começou a circular nas redes sociais um vídeo de um sujeito que arrastava um cachorro com coleira enquanto o espancava por várias ruas. Os acontecimentos foram relatados em Calpulapan, Tlaxcala.

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

No vídeo, retirado das câmeras de segurança do bairro Salvador Guarneros, é possível perceber que o sujeito se arrasta e para em alguns momentos para bater no cachorro com um objeto que não pode ser visto pela definição das imagens. O cachorro, incapaz de se defender, foi encontrado morto metros depois.

Até o momento foi informado que o sujeito está detido e já existe um processo de investigação e uma denúncia com o número C.I.A.I. CALP-2/436/2024.

Sem dúvida um dos casos mais polêmicos dos últimos meses foi o do senador por Oaxaca, Adolfo Gómez Hernández, ativo desde 2021, que organizou a cerimônia em uma das arquibancadas do Senado, onde um grupo de pessoas sacrificou uma galinha e depositaram seu sangue em uma vasilha, isso como um ritual para o Dia da Chuva e em homenagem ao deus Tláloc.

Esta cerimónia causou grande e especial indignação porque os atos de crueldade foram organizados por um senador em exercício, o que rapidamente desencadeou uma resposta dos ativistas e, embora o Senado rapidamente se tenha distanciado dos acontecimentos e se manifestado contra o que aconteceu, ainda não foi determinado se haverá sanção para o senador que organizou a cerimônia.

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Apesar de ter um registro tão extenso desses casos infelizes, estima-se que a taxa de punição no país para maus-tratos a animais seja de 0,01%, o que deixa impune a maioria das situações de maus-tratos a animais.

O trabalho dos ativistas é de extrema importância, porque a legislação mexicana não reconhece plenamente os direitos dos animais, porém, existem leis e conceitos que podem servir para protegê-los, além de sanções criminais para as pessoas que os maltratam. Atualmente, 27 das 32 entidades possuem leis de proteção ou bem-estar animal que estabelecem disposições para garantir o tratamento digno dos animais, embora os maus-tratos sejam considerados crime, com penas que variam de um mês a seis anos de prisão em quase todo o país, nem todas as entidades o consideram desta forma. Chiapas é o único estado que não classifica o abuso de animais como crime e, embora existam iniciativas para integrá-lo ao seu código penal, o trabalho e a pressão dos defensores dos animais junto aos congressos locais são necessários para garantir que o crime de maus-tratos a animais seja aprovado em todos os entes federativos.

O movimento animal diante de uma legislação estagnada

A advogada e ativista Sofía Morín, com 10 anos de experiência na defesa dos direitos dos animais, compartilhou conosco em entrevista ao Somos el Medio quais são as iniciativas que o movimento animal espera que sejam prontamente aprovadas.

“O primeiro é o artigo 73 para que o Congresso da União tenha competência para legislar sobre proteção animal. Até o momento o Congresso da União só tem competência para legislar em relação às questões dos animais silvestres, porque são considerados dentro da questão ambiental, mas, como tal, a proteção dos animais até a data atual não está autorizada. Então, é como se fosse o primeiro passo se quisermos fazer coisas maiores, mais leis”.

“E outra é a proibição dos delfinários, aliás, acho que são duas, essas iniciativas foram votadas na Câmara dos Deputados e estão presas na Câmara dos Senadores”.

E a última é da Organização Animal Heroes onde se pretende proibir a posse de animais silvestres como animais de estimação, muitas vezes eles serão encontrados como animais de estimação, mas preferimos chamá-los de animais de estimação”.

Atualmente não há uma data exata para quando estas iniciativas voltarão a ser discutidas nas câmaras, muitas destas iniciativas permanecem congeladas ou sujeitas a constantes proibições e revogações, como aconteceu com as proibições às touradas.

“Não existe uma verdadeira vontade política, porque é horrível ter de perseguí-los como se estivéssemos num jogo para os obrigar a fazer o seu trabalho, no final é o trabalho deles, os acordos nunca chegam e é por isso que começa a ficar complicado.”

Apesar dos esforços de organizações e pessoas, muitas das iniciativas apresentadas permanecem estagnadas nas diferentes câmaras, o que tem dificultado o progresso nos direitos dos animais.

“No próximo período, todas as organizações vão estar na vanguarda, também bem organizadas, com mais tempo, vamos ter o tema mais estudado, vamos profissionalizar o tema, desde o primeiro dia vamos pressionar as novas câmaras de deputados e senadores para que votem essas iniciativas. A verdade é que duvido que as descongelem ou com certeza ficarão por aí e o mais provável é que tenham que colocá-las novamente na agenda da Câmara dos Deputados para serem aprovados na Câmara dos Deputados e depois nos senadores. Uma grande batalha está por vir, mas reitero, a vantagem é que estamos juntos nisso porque já percebemos que, como não existe uma verdadeira vontade política ou uma verdadeira aplicação das leis, não temos outra escolha senão nos unirmos como a grande união que somos.”

Para os ativistas a favor dos direitos dos animais, é importante abrir espaços de discussão onde possam ser ouvidos argumentos sobre por que a vida e os direitos dos animais devem ser protegidos, sejam eles animais de fazenda ou de estimação, mas apontam o que é importante que está aberto a reconhecê-los como seres capazes de sentir, portanto, o próximo período de sessões é de extrema importância para o movimento porque eles esperam uma agenda muito ativa nesta questão.

“São duas iniciativas superimportantes. A primeira ainda não aconteceu, há anos bloqueiam muito na Câmara dos Deputados e Senadores, ou seja, nem foi jogado fora, mas esperamos que em nível constitucional os animais sejam reconhecidos como seres sencientes. De onde isto vem? Isto está sendo copiado da Constituição Local da Cidade do México, porque desde 2018, onde já foi publicado, foi reiterado que os animais são seres sencientes e que o ser humano ou cidadão tem a obrigação de garantir sua proteção, por sua vida e até menciona sua dignidade. Então o que esperamos é que esse artigo seja replicado na Constituição Federal, que já seja reconhecido como ser senciente, por quê? Porque enquanto não forem reconhecidos como seres sencientes, os animais continuarão legalmente a ser vistos como propriedade.”

Outra das questões com que os ativistas mais têm lutado está relacionada com as touradas, porque apesar de alguns juízes terem emitido suspensões provisórias, que acabam por ser revogadas. O último destes casos ocorreu no início de Maio, onde um juiz do Tribunal Distrital em Assuntos Administrativos suspendeu provisoriamente as touradas na Cidade do México e especialmente na Plaza México para salvaguardar os direitos fundamentais à vida e integridade dos touros. No entanto, a suspensão foi revogada algum tempo depois. Vale ressaltar que com essas medidas há um total de 3 suspensões e 3 revogações.

“A segunda é uma iniciativa cidadã, e o que esta iniciativa busca é a justa proibição de touradas e brigas de galos na Cidade do México e no Estado do México. Os cidadãos podem apresentar iniciativas, a única diferença é que nos pedem um percentual de assinaturas para que essas iniciativas sejam apresentadas. Esta iniciativa começou a funcionar depois que o Supremo Tribunal revogou esta suspensão definitiva das touradas e iremos apresentá-la em setembro no Congresso da Cidade do México e no Congresso do Estado do México, apoiados pela assinatura real dos cidadãos que são contra as touradas”.

O movimento animalista no México, uma luta pelo reconhecimento, pelos direitos e a igualdade entre espécies

Para o movimento pelos direitos dos animais, o trabalho das organizações e dos cidadãos é fundamental, pois foi criado um importante contrapeso contra os interesses econômicos que estão por trás dos setores que trabalham diretamente com os animais e que muitas vezes não tratam estas espécies com dignidade, razão pela qual tornam-se importantes reclamações e propostas de iniciativas que contribuam para a obtenção de direitos para todas as espécies.

“Os partidos se orientam e seguem ordens superiores quando querem votar uma lei, tem o Partido da cor x, e este diz – não quero ficar mal com certa parte da sociedade porque querem proibir as touradas, já ordenei aos meus deputados que são maioria que não votem, ou ordenei que se fizessem de bobos na verdade – e então, o que acontece? As leis nunca são votadas. Portanto, devemos sempre entender que a luta pelos animais é uma luta muito complicada e cansativa porque estamos tocando os interesses de muitas pessoas, interesses econômicos, trabalhistas e de todos os tipos”.

Para os ativistas, é importante manter a agenda aberta para o início do próximo mandato de seis anos, pois será estabelecida uma linha a seguir para a política de direitos dos animais. Apesar disso, Sofía Morín destacou que nenhum candidato procurou as organizações para detalhar seus planos ou propostas em relação aos direitos dos animais.

Uma vida defendendo os animais

A luta para defender os direitos dos animais pode ser muito complicada, requer esforço, recursos, tempo, decisão, coragem, força e acima de tudo comprometimento, muitos ativistas se vêem envolvidos em diversas situações complicadas devido à sua luta. Lorena Vega, também conhecida como Lorena Animalera ou em seu alter ego como Súper Animale, é uma ativista e resgatadora de animais que mora na Cidade do México com trabalho há mais de 38 anos, em sua carreira pôde participar do resgate de múltiplos animais, consequentemente tem testemunhado muitos casos de abuso, indiferença e abandono de animais.

Com grande convicção pelo seu trabalho como ativista e salvadora, Lorena continua a protestar contra os atos e pessoas que transgridem e violam os direitos dos animais. Dedicou grande parte da sua carreira como ativista à luta contra as touradas, buscando a sua proibição total não só na Cidade do México, mas em todo o país.

Lorena Animalera compartilhou conosco como é difícil ser ativista em defesa dos direitos dos animais, apesar das muitas dificuldades que tem enfrentado, seus ideais continuam firmes, a coragem e o esforço têm sido seus pilares para enfrentar sua luta porque ela acredita que é necessário enfrentar injustiças contra outras espécies a todo custo.

Junte-se a nós para saber mais sobre Lorena Animalera nesta entrevista onde ela compartilhou suas experiências e sua luta.

Por Victor Luna / Tradução de Alice Wehrle Gomide

Fonte: Somos El Medio