Entidades protetoras dos animais do DF reclamam da falta de punição

Entidades protetoras dos animais do DF reclamam da falta de punição
Abrigo Fauna e Flora acolheu mais de 10 mil animais - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)

Os crimes de maus-tratos contra animais vêm crescendo na capital, nos últimos quatro anos. De 2019 a 2020 foram 72 casos a mais; de 2020 a 2021, 85; e de 2021 a 2022, 52 (veja quadro). Os números preocupam, mas, por outro lado, existe um movimento de pessoas que socorrem e acolhem os bichinhos que, além de um lar, recebem muito amor.

Nardiane Silva, 33, maquiadora, adotou uma cadelinha que foi vítima de maus-tratos. Cacau, como foi carinhosamente apelidada, chegou a ser abandonada duas vezes. Nardiane conta que a Cacau, da raça yorkshire, foi encontrada na rua, em um dia chuvoso, e levada para uma ONG. Na primeira adoção, a cadela foi abandonada sem cuidados nos fundos da casa, possivelmente devido à doença de pele crônica que a cadela possui, chamada sarna demodécica, que causa mau cheiro, queda de pelos e demanda muitos cuidados.

Cacau foi resgatada novamente e, dessa vez, adotada por pessoas que a amam muito. “Hoje, ela está superbem. Acredito que ela carregue traumas porque toda vez que chove ela fica desesperada. Medo de ser abandonada de novo ela não tem, porque agora encontrou um lar. Nós a amamos demais.” diz Nardiane.

João Igor, 19, estudante, conta que, ao chegar em casa, escutou miados insistentes vindos de uma caixa, localizada em frente a uma pet shop. Ao se aproximar, encontrou um filhote de gato abandonado, machucado e assustado. João Igor, disposto a ficar com o felino, levou o chaninho a um veterinário e comprou todos os itens que precisava para cuidar do animal. “O Tapioca foi bem recebido por todos e virou parte da família. Ele nunca mais vai ser abandonado ou machucado”, enfatiza o tutor.

Para o delegado-chefe da Delegacia de Combate à Ocupação Irregular do Solo e aos Crimes Contra a Ordem Urbanística e o Meio Ambiente (DEMA), Haendel Silva Fonseca, os registros têm aumentado devido a grande divulgação das ações de combate ao crime mencionado. De acordo com o delegado, o efetivo de policiais da unidade responsável pelas apurações dos crimes de maus-tratos foi ampliado e as denúncias recebidas pela Polícia Civil do Distrito Federal atendidas.

Em resolução, o Conselho Regional de Medicina Veterinária (CFMV) considera maus-tratos agredir, abandonar, manter o animal sem acesso a água e comida, expor ao sol ou a ambientes sem qualquer tipo de iluminação, não garantir um ambiente com higiene básica, golpear, ferir ou mutilar voluntariamente qualquer órgão do pet (exceto procedimentos de castração), obrigá-lo a trabalhos excessivos, não providenciar assistência veterinária em casos de doença ou acidentes.

A pena por esse tipo de crime vai de multa de 1 a 40 salários mínimos por animal, até a prisão de 2 a 5 anos, além de proibição da guarda. Em caso de morte do animal, a pena pode ser aumentada em um terço a um sexto.

Jaciel Vitor, 28, atuante na proteção animal, relata ter denunciado um caso em que 230 cães estavam em situação de maus tratos, abandonados em uma propriedade. “Fui até a delegacia de Brazlândia e registrei ocorrência. As autoridades responsáveis foram até o local e comprovaram várias situações de maus-tratos.” recorda. Contudo, o responsável pelo local onde os animais estavam, não foi penalizado. Jaciel conta que o homem se internou em uma clínica psiquiátrica e não sofreu nenhuma consequência.

Assistência

Em março, o Governo do Distrito Federal instaurou a Subsecretaria de Proteção Animal, vinculada à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Proteção Animal do DF, com atribuição de controlar a população de cães e gatos, por meio de campanhas educativas, castrações gratuitas, redução dos casos de abandono, incentivo da adoção responsável — por meio de feiras públicas de adoção — e gestão do Hospital Público Veterinário, o Hvep. O Abril Laranja foi o mês da prevenção contra a crueldade animal.

Projetos criados pela população, como o Acalanto DF, também ajudam os animais maltratados. Os 13 protetores independentes resgatam os bichos e encontram um novo dono para eles. O grupo não possui localização fixa e os resgatados são levados para lares temporários, onde ficam até encontrar um lar definitivo.

Lucimar Aparecida Pereira, 49, idealizadora do projeto, conta que 99% dos animais encontrados foram vítimas de maus-tratos e reclama da falta de recursos para manter os animais, diante do aumento no número de resgates. As doações, segundo ela, não acompanharam esse crescimento.

A protetora enumera as políticas públicas necessárias para os animais: “Faltam vagas para castração, campanhas educativas de adoção responsável, leis mais punitivas para os que cometem maus-tratos (não deveria ter fiança), e apoio por parte do GDF às associações, ONGs e protetores independentes, que fazem o trabalho de acolher, cuidar e zelar centenas de animais”, afirma. “O Estado deveria dar apoio financeiro, rações e medicamentos,” completa.

Desde sua criação, em 2005, o abrigo Fauna e Flora já acolheu mais de 10 mil animais, cães e gatos em situação de risco e vítimas de maus-tratos. Os resgatados têm as doenças tratadas, são vacinados, castrados e, depois, ficam disponíveis para adoção. Atualmente, em torno de 900 animais estão sob cuidados do abrigo, cerca de 600 cães e 300 gatos. A entidade também auxilia 100 famílias carentes com os cuidados de seus bichinhos, fornecendo castração, ração e tratamento.

O vice-presidente do Fauna e Flora, Wellington Fabiano, 35, conta que, dentre as maiores dificuldades que enfrenta, a mais difícil é a conscientização das pessoas. “Castrem seus animais. Não abandonem quando estiverem doentes. Abrigo não é depósito”, aconselha. Ele conta ainda que recebe diversos pedidos de ajuda e, na maioria dos casos, os maus-tratos ocorrem dentro de casa, pelo próprio tutor.

No abrigo, o animal vítima de violência recebe todo o tratamento de recuperação, mas certas marcas deixadas pela agressão permanecem. “Alguns perdem a pata, perdem o olhinho. Se tiver a pelagem preta, é pior. Ninguém quer adotar animais deficientes ou de pelagem preta. A grande maioria desses animais acaba ficando muito tempo no abrigo”, lamenta.

Por Giovanna Estrela sob a supervisão de Márcia Machado

Fonte: Correio Braziliense