Europa no centro do transporte “cruel” de animais vivos

Europa no centro do transporte “cruel” de animais vivos
44 milhões de animais de criação são transportados anualmente entre os Estados-Membros da UE e exportados internacionalmente, muitos deles em viagens de longo curso. Arquivo

Registos de transporte de animais vivos mostram os detalhes das viagens de mais de 180 mil remessas de bovinos, suínos, ovinos e outras espécies na União Europeia (UE) durante 19 meses, entre 2021 e 2023, denunciando o papel da UE no controverso comércio de animais de criação vivos.

Segundo os registos, revelados pelos movimentos “Compassion in World Farming” e “Eurogroup For Animals”, milhões de animais foram transportados por camião, navio e avião em longas viagens que duraram oito horas ou mais, com muitas delas a durarem dias ou mesmo semanas. Os animais foram comercializados entre países europeus ou exportados a nível mundial para fins de reprodução, engorda e abate.

Os investigadores utilizaram registos de viagens de animais, dados comerciais, cartografia por satélite e dados marítimos para compilar uma visão global das viagens de animais vivos. Descobriram que 44 milhões de animais de criação são transportados anualmente entre os Estados-Membros da UE e exportados internacionalmente, muitos deles em viagens de longo curso.

Este número representa uma fração pequena mas significativa dos 1,6 mil milhões de animais vivos, muitos dos quais frangos, que se pensa serem transportados anualmente na UE e a nível internacional. Algumas estimativas sugerem que, num determinado dia, estão em trânsito cinco milhões de animais de criação em todo o mundo.

“Embora soubéssemos que milhões de animais estavam a suportar viagens cruéis e desnecessárias em nome do lucro, este relatório mostra que a situação é muito pior do que temíamos. A UE tem de abordar esta questão com carácter de urgência”, sublinha Peter Stevenson, conselheiro político da “Compassion in World Farming” e principal autor do relatório.

Os ativistas afirmam que estes longos períodos de transporte são cruéis e desnecessários, citando a sobrelotação, a exaustão, a desidratação e o stress como factores-chave que afetam a saúde e o bem-estar dos animais. Foram também manifestadas preocupações quanto à propagação de doenças.

As conclusões, publicadas esta quarta-feira como parte de um relatório mais vasto, surgem numa altura em que a UE se prepara para anunciar, no próximo mês de dezembro, propostas de alteração da regulamentação relativa ao transporte de animais de criação vivos.

O relatório apela a um embargo à exportação de animais de criação da UE para fora do bloco, a limites rigorosos para os tempos de viagem entre os países da UE e à proibição do transporte de animais vivos não desmamados.

Reineke Hameleers, diretora-executiva do “Eurogroup For Animals”, apela a uma transição para o comércio de carne e carcaças, em vez de animais vivos, afirmando que “a natureza transnacional das exportações de animais vivos torna difícil a proteção do bem-estar dos animais”.

A Comissão Europeia afirma que tem vindo a trabalhar para melhorar o bem-estar dos animais há mais de 40 anos, “adoptando normas de bem-estar na legislação que se encontram entre as mais elevadas do mundo”.

A proposta sobre a proteção dos animais durante o transporte, uma das quatro vertentes da legislação, é a mais avançada e será apresentada em dezembro de 2023.

Fonte: JN / mantida a grafia lusitana original


Nota do Olhar Animal: O transporte é uma das situações no sistema de produção de carne e de outros produtos de origem animal em que os animais são submetidos a intensos maus-tratos. Trata-se de um agravante em relação ao dano maior, que é o abate, que viola o interesse mais básico destes seres, que é o interesse em viver. Só há uma forma definitiva de poupar os animais de todo esse sofrimento, só há uma maneira de não ser cúmplice da crueldade e da injustiça cometida contra eles: é não consumindo estes “produtos” e, assim, deixando de financiar as atrocidades cometidas contra estes animais.

Se a morte dos animais é o principal problema, há também outras questões bem graves vinculadas à exportação de animais vivos, como o trabalho escravo e o desmatamento, indicados em uma matéria do UOL que pode ser acessada aqui.