Torturou gatos na Madeira. Tribunal da Relação de Lisboa veio agora absolvê-lo

Torturou gatos na Madeira. Tribunal da Relação de Lisboa veio agora absolvê-lo
O bebé resgatado com vida.

A Associação Ajuda a Alimentar Cães (AAAC), na ilha da Madeira, em Portugal, fez a denúncia na noite de sexta-feira, 10 de março. Um homem que comprovadamente torturou vários gatos, no Funchal, foi ilibado. E isto ao abrigo de uma decisão que considera inconstitucional a lei de 2014 que condena os maus-tratos aos animais.

“As seguintes imagens são chocantes. Neste vídeo, gravado em 2020, é possível verificar um indivíduo a atirar gatos contra a parede e a desferir murros aos mesmos. Os animais que sobreviveram foram resgatados pela Associação Ajuda a Alimentar Cães. A PSP esteve no local”. É assim que começa a descrição da AAAC na sua publicação sobre a decisão judicial de se absolver o autor dos crimes. O post contém um vídeo que é duro de ver – e é aconselhável que as pessoas mais sensíveis não o façam. É a filmagem dos atos brutais que foram cometidos. “Os animais estavam com várias fraturas e problemas nos órgãos internos como foi reportado no relatório médico-veterinário”, sublinha a associação.

O autor do crime, então com 59 anos, disse que os “castigou” por supostamente lhe terem comido parte de uma pizza. Os elementos da AAAC tiveram conhecimento do caso porque um vizinho do individuo filmou tudo e lhes enviou o vídeo – e atuaram de imediato. No vídeo eram visíveis vários gatos bebés, mas, quando lá chegaram, só encontraram a gata mamã e um dos filhotes. “A Associação Ajuda a Alimentar Cães dirigiu-se ontem ao local e retirou da propriedade privada uma gata adulta e um gatinho bebé, únicos animais encontrados. Infelizmente não sabemos o que aconteceu aos restantes”, explicaram. Tudo aponta para que tenham morrido. Os elementos da associação vasculharam tudo e ainda procuraram em contentores do lixo, mas nem sinal deles.

O bebé, batizado de Yoshi, tinha uma patinha partida.
O bebé, batizado de Yoshi, tinha uma patinha partida.

Dois anos depois, a 4 de outubro de 2022, no Tribunal do Funchal, a Juíza Fernanda Sequeira deu como provados todos os factos que constavam da acusação do Ministério Público e condenou o arguido, refere ainda a AAAC. O autor dos atos, E. Mendes, “foi condenado pela prática de dois crimes a maus-tratos a animais na pena de multa de cerca de 1080€. Foi ainda condenado na pena acessória de privação de detenção de animais de companhia pelo período de quatro anos. Terá ainda de pagar uma indemnização de cerca de 210€ à Associação Ajuda a Alimentar Cães, bem como assumir as custas do processo”, referiu então a associação. Mas agora tudo foi revertido.

“Infelizmente, o Tribunal da Relação de Lisboa absolveu agora este indivíduo. Tudo porque a norma legal que prevê este crime está mal feita e já foi declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional”, sublinha a associação madeirense no seu post desta sexta-feira.

Impunidade na Madeira não é caso único

Com efeito, já houve sucessivas declarações de inconstitucionalidade da normal legal existente, que levaram à absolvição de outros indivíduos que cometeram crimes contra animais. E pelo facto de ter havido pelo menos três decisões do Tribunal Constitucional nesse sentido, a 18 de janeiro a Procuradoria-Geral da República informou que o Ministério Público já tinha requerido a inconstitucionalidade definitiva da lei de 2014.

Uma das mais recentes decisões de inconstitucionalidade, a 29 de dezembro, prendeu-se com o incêndio da Agrela, o que levou o grupo Intervenção e Resgate Animal (IRA) a convocar uma grande manifestação nacional para dia 21 de janeiro, em Lisboa – que contou com cerca de 40.000 pessoas. Nesse mesmo dia, o Presidente da República pronunciou-se sobre o assunto e defendeu que o bem-estar animal deve ser “devidamente legislado”, recordando que o parlamento o pode fazer seja “em sede de legislação ordinária” ou através do processo de revisão constitucional que está em curso.

Mas agora, uma vez mais, apesar de haver provas de crime, houve nova absolvição. “Este indivíduo fica agora ileso de qualquer condenação e pode continuar a ter animais. A usar e a abusar dos mesmos como bem entender”, lamenta a Ajuda a Alimentar Cães. No entanto, enquanto há hipótese de recurso, nada é definitivo. “Podemos adiantar que o Ministério Público recorreu do acórdão que o absolveu e a absolvição encontra-se suspensa até decisão final”, informou a AAAC.

A petição pública para que a lei existente seja discutida no Parlamento conta já com 92.497 assinaturas e bastavam 7.500 para ser apreciada em plenário da Assembleia da República.

Percorra a galeria para conhecer o que está definido no Código Penal de outros países.

Por Alexandra Ferreira

Fonte: Pets in Town / mantida a grafia lusitana original

Os comentários abaixo não expressam a opinião da ONG Olhar Animal e são de responsabilidade exclusiva dos respectivos autores.