Alma foi deixada para morrer. Mas tornou-se num milagre e até se apaixonou em Palmela

Alma foi deixada para morrer. Mas tornou-se num milagre e até se apaixonou em Palmela
Alma nasceu com uma anomalia na pata.

É numa das patas que Alma carrega a cicatriz de um passado traumático. Assim que chegou ao mundo, a égua Lusitana — uma das raças com origem portuguesa e também a mais procurada no País — foi negligenciada. Com uma das “mãos” viradas ao contrário, a pequena “não podia ser mãe ou ser montada” e os seus criadores decidiram que “não deveria continuar a viver”.

“Ela foi presa a uma corda, no meio de uma exploração e longe dos outros animais”, começa por contar à PiT Alice Basilio, presidente da Animal Save & Care Portugal, uma das maiores organizações de resgate animal do País. Deixada sem comida ou água, os responsáveis pelo terreno esperavam que a potra morresse. Mas Alma ainda não estava pronta para partir.

“Ela foi comendo ervas que tinha no chão”, sublinha. Houve um dia em que, cansado de ver a condição da cria, um dos empregados do terreno “teve pena” e pediu ajuda para que a tirassem de lá. “Quando a recebemos, ela tinha a corda enfiada na carne porque continuou a crescer e a corda continuou no mesmo sítio”, recorda Alice.

A presidente confessa que os cuidadores “não fazem ideia” quanto tempo Alma ficou presa mas acredita que os então tratadores resolveram “deixá-la morrer” pouco depois de ter nascido. “Ela era minúscula quando chegou”, partilha. Hoje, parece outra. Embora ainda tenha uma das patas ao contrário, é como se fosse uma égua normal.

“Ela recuperou-se completamente. Quando corre, parece que não tem qualquer problema”, diz, animada. A amante de animais partilha que com a ajuda de um veterinário chegou a tentar fazer uma terapia com ferraduras. Mas Alma não deixou. “Ela não aceitou, não quis endireitar a mão. As ferraduras obrigam a pata a estar mais esticada e a mudar um pouco a textura mas ela ficou incomodada”.

Na altura, Alma já estava habituada a andar sem as ferraduras. Com a orientação do veterinário, Alice achou que “não fazia sentido” forçá-la a adaptar-se a uma nova realidade.

Hoje, aos três anos, Alma tem a metade do tamanho que deveria ter para a sua idade enquanto Lusitana. Mas Alice frisa que é melhor assim. “Como tem a pata tão deficiente, é bom que ela não tenha crescido muito porque não se conseguiria aguentar”, explica.

“Todos os veterinários que a seguem dizem que é um caso seríssimo porque normalmente essas deformações fazem com que os cavalos deixem de andar. Contudo, Alma é um milagre. “Ela adaptou-se perfeitamente, corre e galopa, parece que não tem nenhuma anomalia”.

Conheceu a sua “alma gémea” — mas Bernardo não resistiu

Assim como Alma, Bernardo não teve uma vida fácil. O cavalo nasceu no Alentejo num terreno “com um buraco enorme” onde, certo dia, acabou por cair. “Ele foi atacado por cães e o tutor em vez de o ajudar e chamar um veterinário para cuidar dos ferimentos que eram bastante graves, deixou-o ao abandono”, diz à PiT Alice.

Após o ataque, Bernardo perdeu um olho, perfurou o outro, partiu uma das patas e desenvolveu artroses “gravíssimas” em todas as pernas. Contudo, só foi salvo oito meses depois, quando foi encontrado preso numa corda. Ao chegar ao Animal Save & Care, as suas unhas enrolavam-se, “faziam caracóis”, e o equídeo não tinha qualquer estímulo mental. “Praticamente não se mexia ou reagia. Teve de reaprender a viver”, recorda.

No refúgio, conheceu Alma e a dupla teve “uma história de amor única”. Com apenas um olho e 50 por cento da visão, o cavalo começou a correr ao lado da égua, que foi “a sua terapia”, e os dois tornaram-se inseparáveis. “Mesmo com os seus corpos quebrados pelos maus tratos e com mazelas irrecuperáveis, eles corriam como nunca pensámos ser possível”.

Os problemas de saúde, porém, começaram a dificultar o seu dia a dia. Havia dias em que Bernardo caía e não se conseguia levantar — nem mesmo com a ajuda de Alma. “Ela mordiscava-lhe as orelhas, tentava ajudá-lo a levantar-se mas sem sucesso. Foi doloroso vê-lo tão impotente e frágil, e ver a tristeza nos olhos dela por não o conseguir ajudar”.

Houve um dia em que Bernardo já não se levantou. As suas artroses eram muito graves e apesar dos esforços da organização, que chegou a criar uma estrutura para o reerguer, o cavalo não resistiu. “Ficar no chão, inerte, para cavalos, é das piores coisas que pode acontecer”, explica, acrescentando que depois de consultar com vários veterinários, “tiveram de aceitar que não se havia nada a fazer e deixá-lo partir”.

Em maio, foi “colocado para dormir”. Mas ainda é lembrado como um milagre — Bernardo chegou a viver um ano e três meses na organização, mesmo com os todos os problemas. No pouco tempo que teve, foi feliz e até encontrou o amor ao lado de Alma que continua a ser a “deusa” do santuário. “Ela é um amor, o nome dela é perfeito. Tem uma alma e um coração enormes. É mesmo muito especial”.

Carregue na galeria para ver algumas fotografias de Alma e Bernardo.

Por Izabelli Pincelli

Fonte: Pit / mantida a graia lusitana original

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