STF devolve para Tribunal de Justiça de SP julgamento de proibição de foie gras, mantendo lei

STF devolve para Tribunal de Justiça de SP julgamento de proibição de foie gras, mantendo lei

O STF encerrou julgamento acerca da constitucionalidade da lei municipal de SP 16.222/15, que proíbe a produção e comercialização de foie gras (patê de fígado de ganso) no comércio local. Os ministros seguiram, à maioria, o relator, ministro Dias Toffoli, no sentido de que já existe tese fixada pela Corte que valida a elaboração de lei municipal para fins ambientais e, por isso, é o caso de desafetação e cancelamento do tema 1.080 da repercussão geral e devolução dos autos ao Tribunal de origem.

Caso

Em 2016, o TJ/SP julgou inconstitucional a lei de SP 16.222/15, que proíbe a produção e comercialização de foie gras. Ela foi editada com o objetivo de aumentar a proteção aos animais. Para o Tribunal paulista, o município não pode proibir, de forma ampla e geral, a comercialização de determinado produto, interferindo diretamente em sua produção e em seu consumo.

Diante da decisão, o município recorreu ao STF alegando que a lei visa coibir práticas de crueldade aos animais e que o ente federativo municipal é competente para legislar sobre a proteção do meio ambiente. Segundo a argumentação, a vedação da produção e da comercialização de foie gras são matérias de interesse local, porque São Paulo é o maior centro consumidor da mercadoria no território nacional.

Tartine de atum com foie gras do Restaurante Tartar & Co.(Imagem: Leticia Moreira/ Folhapress)
Tartine de atum com foie gras do Restaurante Tartar & Co.(Imagem: Leticia Moreira/ Folhapress)

Impacto potencial

O relator do RE à época, ministro Luiz Fux, se manifestou pela existência de repercussão geral da matéria, diante de sua relevância nos aspectos social, econômico e jurídico. Ele observou que a resolução da controvérsia levará em conta o peso a ser dado, de um lado, ao princípio da livre iniciativa e, de outro, aos princípios da proteção do consumidor e do meio ambiente.

O ministro destacou que a questão transcende os limites subjetivos da causa e tem impacto potencial em diversos casos, pois há municípios, como Florianópolis/SC e Blumenau/SC, que têm legislação semelhante.

Fux lembrou que, no julgamento do RE 586.224, o plenário reconheceu a competência municipal para legislar sobre direito ambiental, no limite do interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados.

Novo relator

Em setembro de 2020, houve mudança na relatoria, por força do art. 38 do RISTF. O processo passou ao ministro Dias Toffoli.

Toffoli, em seu voto, considerou que a questão acerca da competência legislativa municipal em matéria ambiental foi profundamente examinada pelo STF no julgamento do tema 145, cujo acordão externou com clareza o entendimento da Corte sobre a matéria, ou seja, para S. Exa., do julgamento do caso, ficou determinada a existência de competência legislativa municipal na seara ambiental.

“O município é competente para legislar sobre o meio ambiente com a União e o Estado, no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c 30, I e II, da Constituição Federal).”

O ministro disse que o município, ao legislar sobre matéria ambiental deve se harmonizar com os demais entes federados para se adequar aos limites de seu interesse local.

“É dizer: a legislação municipal poderá versar sobre tema já disciplinado por legislação de outro nível hierárquico e até mesmo excepcioná-la, desde que o faça por motivo de flagrante e inequívoco interesse local.”

Para Toffoli, a tese de repercussão geral definida pela Corte é suficiente para o deslinde da causa em que se discute a competência para legislar sobre a proteção da fauna.

“Considero que a plena eficácia do instituto repercussão geral pressupõe que as decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal na sistemática da repercussão geral devem ser aplicadas a todos os processos que tratam da mesma matéria pelas Cortes de origem (…).”

O relator, por fim, entendeu que descabe ao STF se pronunciar sobre a constitucionalidade da referida lei municipal e que, para a solução da lide, seria suficiente a devolução dos autos ao TJ/SP para observância e aplicação da sistemática da repercussão prevista no artigo 1.030 do CPC.

“Proponho, igualmente, que a desafetação ora proposta resulte no cancelamento do Tema 1.080 da repercussão geral, sem que seja fixada tese de repercussão geral para o caso.”

Leia a íntegra do voto.

Os ministros seguiram o entendimento do relator, com exceção do ministro Edson Fachin, que votou para manter o reconhecimento da repercussão geral da matéria, a fim de que a Corte deliberasse sobre a questão.

Fonte: Migalhas