Os palhaços verdes ou do especismo como pústula do sistema

Os palhaços verdes ou do especismo como pústula do sistema

Por Marcio de Almeida Bueno 

Então vemos ao nosso redor pessoas autointituladas como engajadas, como conscientes, como preocupadas com a saúde do planeta – uma coisa bem separada, tal como se os animais morassem na Lua – e querendo abraçar a imagem de uma postura ecologicamente correta, seja lá o que isso signifique. A onda da ecologia no Brasil, nos anos 80, ainda tem ecos naqueles que, incapazes de encarar o grande desafio que é ler um livro, arrotam sua posição de ‘preocupados’. A Amazônia é um fetiche perene, mesmo entre aqueles que palitam os dentes à procura de fiapos de um ex-corpo bovino, assado com amor e temperado com carinho. Aí se coloca um banner do Greenpeace no próprio blog, compra-se uma camiseta com dizeres ‘conscientes’ na feira do final de semana, um pão integral aqui, um leite magro acolá, e está completo o kit de cidadão vestido de palhaço verde.

Incapacidade de ver o caminho que o alimento faz até seu prato bem lavado, ou de enxergar aquilo que está à frente, misturado com uma racionalização do tipo “ah, eu fumo, mas meu tio fumou até os 80 anos e morreu de velho”, ou “ah, o futuro não existe, então eu vou aproveitar agora” – até o dia em que o cara recebe uma sentença de morte no ambiente impessoal de um consultório médico, e aí atribui a um castigo divino, ou outro embuste. Então está o alimento de origem animal como uma necessidade que, por procuração, terceiros providenciaram para si, e fim de papo. E o comensal se agarra àquilo com o temor de uma criança, buscando garantia e segurança nutricional, já que ouviu da mãe e da professora sobre a importância dos alimentos. E nada mais pôde aprender, após os sete anos de idade.

E quando é necessário refletir sobre os desgovernos da sociedade, sobre as feridas que sangram e fedem, obviamente que, tal como a Amazônia, repete-se aquilo que o sistema já providenciou como objeto louvável de preocupação e prioridade – crianças de rua, velhinhos em asilos. Curiosamente esses problemas ainda existem, apesar de todos se mostrarem indignados, atarefados e preocupados – novamente esta palavra – com a situação. Mas quem fala ‘animais’ é que é o insensível sociopata que não sente nada, nada faz e sequer se preocupa com Amazônia, monocultura de eucaliptos, velhinhos nos asilos, crianças passando fome, a criminalidade no Rio de Janeiro, a seca no Nordeste, as enchentes em Santa Catarina, agrotóxicos ou aquecimento global. Vejam só.

Lembrar que ainda falta incluir os animais no círculo da significação moral, para a maioria, é mostrar-se preocupado com unicórnios, dinossauros, ETs e demais seres distantes e inacessíveis. Coisa de quem ‘não tem mesmo o que fazer’, como ouço seguidamente.

Mas ninguém enche a boca pra dizer que está pouco se lixando pra Amazônia, e ponto-final. Seria feio. Pegaria mal. Mesmo que sua atitude cotidiana, por opção, esteja causando estragos que rendem assunto na barbearia e capas para as revistas semanais.

Mas não dá para tentar explicar que diferenciar o cachorro da família do boi em pé no Mato Grosso é o primeiro passo para viver um dia a dia de indiferença real, como no tempo em que se jogava o conteúdo dos penicos pela janela, e pronto. Tem gente que aprendeu desde cedo a ter uma resposta na ponta da língua, para não deixar que o eventual remorso atrapalhe os afazeres. Um alívio para a consciência, e uma salvaguarda contra os discursos e dados dos veganos, esses radicais cujas ideias subvertem a paz e o amor no qual o mundo flutua, hoje e sempre.

MARCIO 2009 12 03 vanguarda 

Fonte: ANDA


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