Retirada de animais em obras de barragem em Cordeirópolis (SP) pode gerar problemas populacionais e disputas, diz professor da USP

Retirada de animais em obras de barragem em Cordeirópolis (SP) pode gerar problemas populacionais e disputas, diz professor da USP
Área da construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Edijan Del Santo/EPTV

A retirada de animais da área onde está sendo construída a Barragem de Santa Marina, em Cordeirópolis (SP) e a soltura em outros locais pode gerar problemas populacionais, disputas territoriais e aumentar o nível de estresse dos indivíduos retirados e daqueles que já habitam o novo território. É o que indicam especialistas consultados pelo g1. Veja abaixo

A Barragem Santa Marina, segundo a Prefeitura de Cordeirópolis, será inaugurada em junho de 2024 e está sendo construída em uma área de 730 mil metros quadrados, equivalente a 47 campos de futebol.

No processo de construção, os animais localizados na área são avaliados por uma equipe formada por biólogos e veterinários. Mais de mil indivíduos de diferentes espécies já foram encontrados e resgatados.

Macaco resgatado na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis
Macaco resgatado na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis

“Após a avaliação da equipe, ocorre a soltura na natureza. Em caso de o animal resgatado apresentar algum machucado, o mesmo é encaminhado a centros de reabilitação de animais silvestres que têm parceria com o empreendimento”, afirma Diego Alves, engenheiro civil responsável pela obra.

A equipe que atua na área já encontrou pássaros, serpentes, guaxinins, macacos e outras espécies. Alguns indivíduos são levados para matas próximas ao local.

“Os locais de soltura dos animais estão localizados a aproximadamente 600 metros da barragem, justamente para que o animal não sinta a mudança do local de onde foi encontrado”, diz Diego Alves.

Aves também foram resgatadas na área da construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Prefeitura de Cordeirópolis/Alexsander Rabelo
Aves também foram resgatadas na área da construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Prefeitura de Cordeirópolis/Alexsander Rabelo

Problemas nas populações de animais

Professor do departamento de Ciências Biológicas da Esalq/USP e zoólogo especialista em mamíferos, Alexandre Percequillo, aponta a perda do ambiente natural dos animais como um problema que gera importantes impactos.

“Isso tem impactos extremamente negativos nas populações de animais que habitam aquelas regiões e nas populações vizinhas. Quando está acontecendo o enchimento do reservatório, algumas espécies são capturadas no resgate, mas muitas conseguem fugir e vão invadir áreas de vida de espécies que são vizinhas à área do reservatório”, diz.

A mudança do território, na opinião de Percequillo, gera problemas para os animais retirados e para aqueles que vivem no novo local.

Alexandre Percequillo, pesquisador da Esalq/USP — Foto: Rafael Bitencourt/g1
Alexandre Percequillo, pesquisador da Esalq/USP — Foto: Rafael Bitencourt/g1

“Isso certamente vai causar problemas populacionais, disputas territoriais e aumentar o nível de estresse do animal retirado e do indivíduo que está recebendo, dentro de sua área de vida, esse novo indivíduo, que vai competir com ele por recursos, acasalamento e uma série de questões”, explica.

O professor da USP aponta ainda que existem espécies animais que têm um comportamento de filopatria, ou seja, possuem o hábito de voltar ao local onde nasceram.

“Você pode transportar esse animal para uma área distante, mas ele vai ter a tendência, muitas vezes, de voltar para aquele lugar onde ele foi capturado. E nesse percurso de volta ele pode ser atropelado, pode ser morto por algum caçador, e pode voltar para uma área onde o ambiente em que ele vivia não existe mais”, aponta Percequillo.

Impacto no habitat dos animais

Para o engenheiro florestal Germano Chagas, um dos coordenadores técnicos do projeto Corredor Caipira – Conectando Paisagens e Pessoas, a construção de uma barragem e o consequente alagamento da região da construção podem gerar problemas ambientais e impactar os habitats dos animais.

“Além da mudança do fluxo natural do rio, da alteração na temperatura da água e na concentração de sedimentos na região acima da barragem, que resultam em impacto sobre a fauna aquática, o alagamento impacta os hábitats terrestres nas margens dos rios”, diz.

Germano Chagas é um dos coordenadores técnicos do Corredor Caipira — Foto: Rafael Bitencourt
Germano Chagas é um dos coordenadores técnicos do Corredor Caipira — Foto: Rafael Bitencourt

“Esses habitats, muitas vezes, funcionam como corredores ecológicos para a fauna, que conectam remanescentes florestais isolados e desempenham uma função importante na movimentação dos animais”, completa Chagas.

‘Algumas características rurais’

De acordo com o engenheiro responsável, a barragem de Santa Marina fica em uma área urbana “que ainda apresenta algumas características rurais, como brejos e pequenos fragmentos de florestas”.

“Para a implantação da barragem foram desenvolvidos diversos programas ambientais para minimizar o impacto ambiental da obra. Um dos programas é o resgate da fauna e ictiofauna que se encontravam na área da obra”, completa Diego Alves.

O resgate dos animais, de acordo com a Prefeitura de Cordeirópolis, está sendo realizada por veterinários e biólogos autorizados pelo Departamento de Fauna, da Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais, o DeFau CBRN, órgão ambiental ligado ao Sistema Integrado de Gestão Ambiental da Fauna de São Paulo (Gefau).

Roedor resgatada na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis
Roedor resgatada na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis

Ainda segundo a prefeitura, o trabalho é autorizado pelo Departamento de Gestão da Fauna Silvestre (DeFau) e estão sendo seguidas as orientações do departamento e do programa de Resgate e Translocação de Fauna Silvestre.

Acompanhamento

A retirada dos animais, de acordo com a prefeitura, está sendo realizada por veterinários e biólogos autorizados Departamento de Fauna, da Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais, o DeFau CBRN, órgão ambiental ligado ao Sistema Integrado de Gestão Ambiental da Fauna de São Paulo (Gefau).

Ainda segundo a prefeitura, o trabalho é autorizado Departamento de Gestão da Fauna Silvestre (DeFau) e estão sendo seguidas as orientações do departamento e do programa de Resgate e Translocação de Fauna Silvestre.

Roedor resgatado na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis
Roedor resgatado na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis

Na área há um espaço que funciona como base de apoio da equipe. Quando estão machucados, os animais são levados ao local, que conta com medicamentos, para que sejam atendidos.

“A gente tem uma maleta com medicamentos emergenciais, de primeiros socorros e caso precise a gente procede com o atendimento de urgência e emergência aqui”, afirma a veterinária Milena Pereira, membro da equipe.

No local, há uma espécie de estufa, para onde os ovos são levados e onde ficam até os filhotes nascerem para serem encaminhados a locais em Botucatu e Araras. Entre as espécies com ovos levados até o local estão quero-queros e corujas.

Cobra resgatada na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis
Cobra resgatada na área de construção da barragem em Cordeirópolis — Foto: Divulgação/Prefeitura de Cordeirópolis

Por Rafael Bitencourt

Fonte: G1

Os comentários abaixo não expressam a opinião da ONG Olhar Animal e são de responsabilidade exclusiva dos respectivos autores.