Milhões de pessoas assistiram a este YouTuber criar um porco de estimação. Então ele compartilhou o jantar.

Milhões de pessoas assistiram a este YouTuber criar um porco de estimação. Então ele compartilhou o jantar.
KALBI, porco e estrela do YouTube / crédito: Youtube / Eaten Pig after 100 days

IMAGENS FORTES – Kalbi, o leitão rosa, foi tratado como qualquer outro animal de estimação amado. Apesar do nome irônico, Kalbi, que significa costelas assadas em coreano, o porco aparecia vestido com roupas fofas e enrolado em cobertores como um bebê. Os vídeos amorosos do porco ganharam um canal no YouTube com cerca de 100.000 seguidores poucas semanas após sua estreia.

Mas entre as fotos carinhosas de Kalbi, seu tutor mostrava pedaços de carne de porco crua para a câmera, um alerta sobre o suposto objetivo do YouTuber: comer seu animal de estimação após 100 dias.

As dezenas de milhares de espectadores que se afeiçoaram ao porco imploravam ao YouTuber para poupar a vida de Kalbi. Alguns diziam que aquilo era nada menos do que crueldade contra os animais, e chamavam o apresentador de psicopata. Um dos comentaristas implorou ao dono do porco que se colocasse no lugar de Kalbi: “Como você se sentiria se amasse alguém profundamente, mas essa pessoa estivesse apenas esperando para matá-lo?”

A contagem regressiva de 100 dias terminou em 1º de setembro, quando o dono do canal do YouTube “Porco Comido após 100 dias” publicou um vídeo em que ele retira uma carcaça de porco de uma caixa de papelão, tempera a carne e a cozinha. Presumidamente, Kalbi estava morto.

“Anormal”, “cruel”, “nojento”: o repúdio inundou a seção de comentários do vídeo, que foi assistido milhões de vezes, mais do que qualquer um dos outros 102 filmes do canal. E o YouTuber, que simplesmente se refere a si mesmo como “o proprietário”, recebeu ameaças de morte e bomba por suas ações.

Porco assado no 100º vídeo / crèdito: Youtube / Eaten Pig after 100 days
Porco assado no 100º vídeo / crèdito: Youtube / Eaten Pig after 100 days

Ao falar ao canal VICE World News sob condição de anonimato (ele teme pela sua segurança), o dono do canal do YouTube disse que seus vídeos têm como objetivo fazer as pessoas pensarem sobre o que comem. Ele disse que o objetivo era mostrar que a carne de supermercado vem de animais tão fofos quanto Kalbi, e que se as pessoas optam por comer carne, como o próprio YouTuber faz, elas deveriam pelo menos agradecer ao sacrifício do animal.

“A maneira como normalmente falamos sobre as consequências de comer carne não chama muita atenção. Para que a mensagem seja transmitida, muitas pessoas precisam ver”, disse ele.

O desperdício de alimentos é um problema global e o YouTuber acredita que isso poderia ser atenuado se mais pessoas considerassem a carne um recurso precioso. No Japão, as autoridades adotaram medidas para incentivar a redução de desperdício de alimentos. Uma pesquisa de 2019 do governo, sugere que quase 80% das pessoas têm tomado alguma medida, como comprar menos mantimentos de uma vez, comer sobras e comer fora do “prazo de validade”, para reduzir o desperdício.

No decorrer de 100 dias, o YouTuber paparicou e mimou Kalbi.
No decorrer de 100 dias, o YouTuber paparicou e mimou Kalbi.

Trabalhando com uma empresa de edição de vídeo japonesa, o YouTuber, na casa dos seus 30 anos, escolheu um porco para se destacar em um supersaturado mercado de mídia de animais de estimação. “Já existem muitos canais de cães e gatos, então consideramos que não teríamos muitas visualizações se abríssemos um”, disse ele.

Sua estratégia valeu a pena. A plataforma de seu canal ganhou mais de 100.000 inscritos em 100 dias, e mais de três milhões de pessoas assistiram ao vídeo final, no qual um porco era lavado, regado com azeite de oliva, temperado com sal e pimenta e assado em uma grelha externa para ficar com um perfeito marrom âmbar. Vê-se então o proprietário em frente a um Butsudan improvisado (altar de família Budista) a oferecer seus respeitos a Kalbi, o mesmo com quem ele se sentou durante a entrevista para o VICE World News. O vídeo termina com uma comovente montagem dos supostos melhores dias de Kabli.

Reviravolta: em 10 de setembro, o YouTuber carregou um vídeo onde mostra que Kalbi está vivo e bem. Um outro porco foi preparado para o jantar.

Alguns espectadores ficaram aliviados. Mas outros ainda o acusaram de usar porcos para cliques e lucros às custas do bem-estar emocional deles; assistir a um porco fofinho inconsciente de sua predestinada morte é evidentemente muito angustiante.

Criar e matar porcos para apresentar um ponto de vista sobre a valorização da comida não agradou a alguns grupos de direitos dos animais.

“Porcos são animais espertos, curiosos e brincalhões. Matá-los é tão antiético quanto cortar a garganta do cachorro da família”, disse Nirali Shah, representante da PETA, ao VICE World News.

“Apelamos a todos que não assistam a este canal do YouTube e que mostrem compaixão a todos os porcos e outros animais, deixando-os fora de seus pratos.”

Susie Khamis, Professora de Estudos de Mídia e Cultura do Consumidor na Universidade de Tecnologia de Sydney, disse que a falta de acompanhamento do canal do Youtube com organizações que combatem o desperdício de alimentos o tornou “banal.”

“Ele corre o risco de ser identificado como apenas uma brincadeira, ou um tipo de pegadinha”, disse ela ao VICE World News.

“É difícil levar uma campanha a sério e ter fé em quaisquer futuros projetos que o YouTuber planeje em torno desta causa”, acrescentou ela.

O YouTuber reconheceu que havia muitas opiniões conflitantes sobre o propósito de seu canal. Mas ao apontar para o crescimento da audiência de sua plataforma, ele disse que havia alcançado seu objetivo: fazer as pessoas fritarem seus bacons com uma pitada de gratidão.

Por Hanako Montgomery / Traduzido por Simone Valiceli

Fonte: Vice


Nota do Olhar Animal: O que o youtuber conseguiu foi escancarar a gigantesca hipocrisia e o egoísmo seu e de todos que manifestaram “alívio” pelo fato do animal morto não ser aquele pelo qual desenvolveram afeto. Respeitar os animais é respeitar seus interesses, especialmente o mais básico deles, que é o interesse em viver. Para o animal é óbvio que a “gratidão” de quem o matará (ou financiará sua morte) é desprezível.

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