O elefantinho da foto ou ‘Esse defeito ambulante’

O elefantinho da foto ou ‘Esse defeito ambulante’

Por Marcio de Almeida Bueno

Marcio elefante

Então, na foto, o elefantinho não parece satisfeito com a corrente no pescoço, nem com o humano-dono que lhe orquestra os movimentos através do toque em sua orelha. O mundo sob coleira. Houve um momento em que um bebê gorducho, de vida promissora para terceiros, foi separado da mãe, e a lembrança da tromba carinhosa e do couro áspero, de maciez profunda, seguem como esperança para, talvez, um novo abrir de olhos, após o sono noturno. Mas cada dia se revela um expediente de cansaço, de transporte, ordens, palmadas de menor ou maior dor, frustração, tristeza e humanos que parecem felizes. A esperança parece residir em outra vida, então.

Turistas trouxas vêm de longe para, vejam que típico, fazer cafuné em um elefante ‘de verdade’, conduzido por um nativo local sorridente, talvez também umas fotos e um passeio para, assim sim, desfrutar a vida. E ali está o elefantinho como uma catraca viva, pela qual todos passam e deixam um registro, e vão embora sem contabilizar o que ficou. Tal como cavalos que estão em charretes na praia, dromedários-buggy, macaquinhos amestrados, papagaios de camelô, mulas para subir montanhas, e outros animais-roleta.

Houve um dia em que o humano escolheu bem o tamanho da corrente, e a passou solenemente ao redor do pescoço do elefante. Como a gravata colocada em um defunto, a última que vestirá. Pois a liberdade do não-humano foi enterrada ainda lá atrás, quando um primeiro antepassado passou a estar sob jugo humano. O que foi nascendo, em sequência, já veio sob as regras não da natureza, mas de um ser ardiloso que contabiliza o trabalho alheio como seu. Diminui a própria falta de liberdade abocanhando as alheias. E a tudo isso, chama-se ‘ponto alto da evolução’, ‘topo da cadeia alimentar’ ou algum engodo similar perpetrado pela tradição, sociedade, religião, moral ou legislação. Não necessariamente nessa ordem.

O turista que por ali passou não viu bastidores, o palhaço que chora após tirar a maquiagem, não viu o elefante que dorme com a pata presa, pecuarizado, joguete da cobiça humana – esse defeito ambulante que tanto inveja as asas das aves, a bravura das feras, a agilidade de alguns, a maciez de outros, a força de uns, a organização de certos animais. E a liberade de todos eles.

Corrompida de início, mascara-se com ‘comida e água’, com descanso, com sorrisos para fotos e bons modos na frente das visitas. E assim está dócil o cavalo já domado, o leão adestrado, o cachorro submisso, o passarinho engaiolado, as vacas que vão sozinhas para o curral, o mundo obediente. A liberade sob ordens.


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