Mulher que já resgatou 100 animais na Cracolândia corre risco de despejo
Dezenas de cães e gatos que viviam na Cracolândia, no centro de São Paulo, antes das recentes operações policiais contra traficantes e usuários de drogas encontraram um lar na pensão onde vive a paraibana Maria das Graças Bernardino, a Dona Graça. Aos 57 anos — 15 deles morando na região da Luz e acompanhando a degradação do local —, a doméstica resgata animais desde 2014 e já chegou a ter mais de 100 animais em casa. Perto de ser despejada, devido à situação irregular do terreno em que vive, ela agora apela pela adoção dos animais.
— Não sei o que fazer da vida. Vou para onde com esses cachorros? — preocupa-se ela.
Dona Graça chegou “fugida da fome” em São Paulo ainda criança. Diz que “fez de tudo” na vida para pagar as contas, mas a maior parte da pouca economia que possui veio do trabalho como empregada doméstica. O antigo patrão, já falecido, pediu para ajudá-lo a tomar conta da pensão de 30 quartos que mantinha na Alameda Dino Bueno, no Centro, bem próximo à concentração de usuários de drogas, e ela passou a viver no local.
Até a operação policial de maio, que culminou na mudança da Cracolândia da rua Helvetia para a praça Princesa Isabel, Dona Graça pagava suas contas e a da neta de 17 anos com os R$ 600 mensais que recebia do aluguel dos quartos. Conhecida na região, foi conquistando aos poucos a confiança dos usuários, enquanto distribuía cobertor e comida, sempre na companhia de seus cães de guarda Choquito, Neguinha, Estrelinha e Mel. Virou uma referência, e, quando moradores se viam sem condições de cuidar de seus animais, deixavam os cachorros no portão da pensão, certos de que seriam bem recepcionados.
— Os viciados pegam os cachorros, mas quando ficam doentes eles deixam aqui e não voltam para pegar. E fui ficando, até que me vi nessa situação — diz ela, mãe de duas filhas.
Dona Graça conta que, após a operação na Cracolândia, foi impedida de continuar alugando os quartos. O herdeiro do imóvel, afirma ela, deve vender o local. Mas apesar de hoje viver do pouco que arrecadou a vida inteira, decidiu resgatar sozinha as dezenas de cães e gatos deixados para trás após as ações de segurança. Os gastos com os hóspedes de quatro patas, que chegam R$ 450 semanais, são divididos entre a neta, uma amiga e voluntários.
— Pedi ajuda à prefeitura para recolher os animais, mas só ofereceram castração. Nesta semana estou levando cinco para operar — fala ela, aliviada:
— Preciso agora de ração para os gatos. Está pela metade.
A história de Dona Graça se espalhou pelas redes sociais, e uma das ONGs que ajudam a diarista resgatou 71 animais da pensão. No último dia 20, o Instituto Luisa Mell levou os bichinhos para um abrigo em Ribeirão Pires, na região metropolitana, e pretende colocá-los para adoção em breve. Os mais de 20 cães e gatos que ficaram com Dona Graça seguem recebendo ajuda da instituição, que envia vacinas e comida.
— Nossa missão é ajudar os animais — decreta Dona Graça.
Por Luiza Souto