Belém (PA) registra mais de mil animais no proibido transporte de tração animal

Belém (PA) registra mais de mil animais no proibido transporte de tração animal
Carroças são avistadas nos bairros de Belém, confirmando a polêmica sobre a legislação de proteção aos animais (Foto: Cristino Martins / O Liberal)

O transporte via tração animal em áreas urbanas é proibido por lei estadual em vigor, mas na Grande Belém mais de mil animais (cavalos e burros) são utilizados no dia a dia, como destaca o médico veterinário e professor da Universidade Federal Rural do Pará (Ufra), Djacy Ribeiro. O professor Djacy coordena o Projeto Carroceiro, de atendimento a animais retirados de circulação pública. “Existe a legislação estadual e também a de Belém e de Ananindeua, por exemplo, mas o cumprimento dessa lei esbarra em dois aspectos, que são a necessidade de os animais serem substituídos por bicicletas e motos e também a de se dispor de um local para que possam permanecer”, ressalta o professor.

Em agosto deste ano, o Projeto Carroceiro, da Ufra, completará 20 anos de funcionamento, na proposta de promover o atendimento médico veterinário de animais basicamente empregados em tração animal em Belém e até outros municípios. Nesse período, foram atendidos cerca de 1.500 animais tanto na sede da Ufra como por meio de ações itinerantes nos bairros mais distantes de Belém. “Há cerca de 8 anos, eram 2.500 animais no espaço urbano”, acrescenta o professor.

“No começo, tratavámos dos animais, e, aos poucos, fomos fazendo um trabalho de conscientização dos carroceiros diante dos maus tratos aos cavalos e burros, basicamente”, observa o professor Djacy Ribeiro. Desse modo, a experiência do projeto funcionou como subsídio para a elaboração da legislação estadual e municipal contra os maus tratos a animais e o transporte via tração animal.

Animais são descartados no dia a dia das cidades

O professor relata acerca das condições em que os animais chegam para atendimento no “Carroceiro” que eles sofrem maus tratos físicos e psicológicos, padecendo de alimentação adequada; sem descanso e local específico para tomar água; as carroças não são padronizadas e em madeira pesada, com eixos de carros; há casos de um animal ter dois donos e trabalhar para ambos em um dia; ao término do trabalho, são amarrados ou soltos para se alimentar (pouca alimentação, sem repor o que perdem de nutrientes); circulação perigosa até na contramão no tráfego de veículos em vias urbanas.

Em algumas cidades do Brasil, os cavalos e burros têm sido substituídos por motos e bicicletas para o transporte de carga, os chamados “cavalos de lata”.

No artigo nº 43 da lei federal nº 9.605, que dispõe sobre meio ambiente, é prevista a pena de detenção, de três meses a um ano, e multa para quem “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”.

Poder Público deve se preparar para cumprir a legislação

O ex-deputado estadual Miro Sanova, autor do projeto de lei que originou a legislação acerca da tração animal no Estado, destaca que a aprovação e sanção do Código de Proteção Animal no Pará constituem-se em “um grande avanço em defesa dos animais, não só os domésticos mas também para os silvestres, e o Estado do Pará é um dos poucos estados que conseguiu produzir uma legislação nesse sentido”. Sanova diz que a lei é importante porque sem ela não existe o direito, “e as pessoas muito me indagam hoje por que deputado ou ex-deputado Miro, por que a lei não funciona? por que isso não acontece?”.

“Eu sempre falo que já é um avanço ter a lei, mas é necessário que as instituições se preparem para o cumprimento da lei, as instituições da área do Poder Executivo, do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, precisam se preparar para que essa lei seja mais eficiente na sua fiscalização; antigamente, antes da Lei Maria da Penha, não existia tanta rede de proteção em defesa da mulher, e não é diferente na questão da proteção animal; então, as instituições devem criar mecanismos para que essa lei seja eficiente”, ressalta Miro Sanova.

Dois temas da legislação estadual vigente são muitos cobrados: a proibição da tração animal nas áreas urbanas do Estado, ou seja, “não pode animal, como cavalo, puxar carroça nas cidades do Pará, nas áreas urbanas, e também a soltura dos fogos com estampido; é proibido, e essa lei é também importante, inclusive, para as pessoas com autismo, com deficiência”.

Miro Sanova destaca, ainda sobre a tração animal, que “as prefeituras precisam se organizar, fiscalizar com mais eficiência, porque há situações lamentáveis de animais sendo explorados por ser humano, com carroças na rua, e as prefeituras precisam se preparar para fiscalizar e também preparar locais para recepcionar esses animais”.

De acordo com a lei nº 9.593, na Seção II – Das Atividades de Tração e Carga, está estabelecido: “ Art. 12. Só é permitida a tração animal de veículos ou instrumentos agrícolas e industriais, por bovinos e equídeos, que compreende equinos, muares e asininos, na zona rural do Estado do Pará”.

Prefeitura busca redução gradativa da tração animal

A Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (Semob) explica que a lei nº 9.593/2022 é uma lei estadual, que institui o Código de Proteção aos Animais no Estado do Pará. O texto estabelece normas para a proteção, defesa e preservação dos animais do Estado, sendo eles doméstico, exótico e silvestre, e trata a tração animal em um capítulo apenas. A Autarquia explica que as ações, desenvolvidas pela Prefeitura de Belém, buscam a redução gradativa da tração animal, em conformidade com a Lei nº 9.411, de 18 de dezembro de 2018, que institui, no Município de Belém, o programa de redução gradativa do número de veículos de tração animal que circulam no trânsito em áreas urbanas.

“O texto estabelece, em seu artigo 2º, o prazo de 10 anos, a partir da data da entrada em vigor da lei, para que seja proibida, em definitivo, em áreas urbanas, a circulação de veículos de tração animal e a condução de animais com carga, com exploração do animal para essas finalidades”, comunica a Semob.

Essa atividade ainda responde pela fonte de renda de algumas famílias e não se trata apenas dos animais, mas também de seus proprietários. “Desde 2021, a Semob tem realizado reuniões com instituições parceiras de órgão em nível municipal, estadual e federal, além da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará), Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais, para tratar deste tema, com o objetivo de montar estratégias de redução do transporte de tração animal em Belém”.

Nessas reuniões, foram levantadas legislações, além de propostas de estratégias para atendimento dos animais e cadastramento dos condutores. Ainda em 2022, foi realizada uma ação piloto, com o apoio do Centro de Zoonoses da Sesma, do Ministério Público do Estado e da Universidade Federal Rural da Amazônia, para abordagem e microchipagem dos animais, no distrito de Outeiro, como repassa a Semob.

196 inquéritos

A Polícia Civil informa que a fiscalização sobre maus-tratos animais é feita a partir da formalização da denúncia junto a Divisão Especializada em Meio Ambiente e Proteção Animal (Demapa), Delegacia Virtual, Disque-Denúncia ou na delegacia mais próxima ao local da ocorrência. Em 2023, foram instaurados 196 inquéritos policiais em todo o estado para investigar denúncias de maus-tratos contra animais.

Por Eduardo Rocha

Fonte: O LIberal

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